Opinião e Análise

Isadora Cohen

Luísa Dubourcq Santana

Matheus Cadedo

Como se sabe, as concessões são remuneradas mediante tarifas pagas diretamente pelos usuários, podendo ou não existir complementação de recursos por parte do Poder Concedente, conforme se trate, respectivamente, de concessão patrocinada ou comum. Na forma da Lei nº 8.987/1995, o valor das tarifas praticadas pelo concessionário é estabelecido conforme a sua proposta na licitação, compreendendo montante destinado à amortização dos investimentos realizados e à remuneração do serviço prestado, sujeito a maior ou menor grau de regulação<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>.
Independente dos diversos temas que podem ser discutidos no âmbito da definição dos valores das tarifas e da regulação tarifária, propomos aqui uma visão inovadora sobre um único aspecto: o arredondamento dos valores das tarifas pagas pelos usuários da infraestrutura/serviço ofertado pela concessionária e a viabilidade de direcionar recursos para monetizar conservação ambiental.
<a href="http://conteudo.jota.info/aprovometro-jota"><img class="aligncenter wp-image-292714 size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/aprovometro.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>
Valores não arredondados de tarifas podem gerar problemas operacionais para concessionárias – em especial pela dificuldade de conferir troco e ter, para tanto, que dispor de grande quantidade de moedas de baixo valor para viabilizar essa transação.
Nesse sentido, interessante verificar soluções criativas de modelagem de projetos de concessões para amenizar desafios relacionados ao “troco”. Vejamos o caso, por exemplo, do item 5 do Anexo V do Contrato do Lote PIPA - recentemente contratado pela Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp), que determina a regra de arredondamento das tarifas revistas ou reajustas para que sejam expressas sempre em múltiplos de R$ 0,05.
Assim, ainda que o reajuste da tarifa pudesse reverter em valor “quebrado”, a modelagem já, de partida, previu que os valores pagos pelos usuários seriam o múltiplo de R$ 0,05 imediatamente superior.
Claro que há uma tendência crescente – e comemoramos isso – de mecanismos automáticos e mais modernos de pagamento estarem à disposição dos usuários e cada vez mais aceitos por reguladores e poderes concedentes. Isso pode facilitar essa questão operacional, mas não desmonta a proposta que queremos debater no presente artigo.
Tudo isso para dizer que, seja no caso “analógico” ou no caso “digital”, o arredondamento das tarifas é um tema que pode gerar recursos para viabilizar a monetização de atividades de conservação ambiental ou outros propósitos alinhados às pautas de Environmental, Social and Corporate Governance (ESG), conferindo maior visibilidade à questões de interesse público<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>.
A título exemplificativo, pode-se imaginar, de um lado, uma concessão rodoviária regulada por determinado ente, e, de outro lado uma rede credenciada de particulares detentores de áreas florestais. Suponhamos (i) uma regra de arredondamento estabelecida pelo regulador; e (ii) uma definição regulatória de que o saldo - da razão entre o valor arredondado (pago pelo usuário) e o valor real (expressão da tarifa reajusta sem arredondamento) - fosse integralmente vertido para apoiar as atividades de preservação de florestas.
O regulador poderia induzir tal política por meio de incentivos (inclusive econômicos) para que as concessionárias adotassem a prática de estimular atividades ligadas à conservação e, quem sabe, estabelecer critérios de credenciamento para proprietários de áreas florestais, mediante a comprovação de algumas condições associadas à conservação dos terrenos (alinhadas com autoridades e exigências ambientais).
Também é importante destacar que não só a coletividade e o meio ambiente são beneficiados por essa equação, mas também as próprias concessionárias. Isso porque as chamadas “empresas verdes”, que promovem atividades de auxílio e conservação ambiental, ganham capital reputacional e político que gera externalidades positivas aos valores de seus títulos e ações negociados no Mercado. A própria Bolsa de Valores de São Paulo [B3], instituiu, há alguns anos, a chamada “Carteira do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE)”, uma lista de companhias que adotam um sistema de governança e políticas ambientalmente sustentáveis.
<blockquote class="jota-article__eye">Os dados acabam por demonstrar que as companhias atentas à sustentabilidade são mais bem avaliadas do que as que não demonstram preocupação ambiental.</blockquote>
Desde 2005, o ISE B3 subiu 266,19%, contra uma alta de 235,43% do Ibovespa. A volatilidade da carteira também é menor se comparada com as negociações tradicionais: 23,86% do ISE contra 26,51% do Ibovespa<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>. Em síntese, identificam-se incentivos econômicos para que as concessionárias busquem e apoiem políticas ambientais. Tem-se, com isso, a conjunção entre múltiplos interesses e, no final do dia, o privado, o meio ambiente a sociedade saem ganhando<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>.
As concessionárias de serviço público, em especial em alguns setores que demandam alto nível de construção civil, acabam por gerar passivos ambientais. A destinação dos recursos provenientes do arredondamento poderia ser medida compensatória – ainda que parcial – dos passivos ambientais gerados por tais concessões.
Por fim, interessante notar que ESG está cada vez mais ganhando a atenção e foco de investidores e financiadores, sobretudo estrangeiros, de modo que a instituição de mecanismos desta natureza acabaria também por incentivar e favorecer o ambiente de negócios no país, com ganhos até mesmo para os segmentos não diretamente relacionados ao objeto da concessão em si. Medidas relativamente simples podem ampliar as fronteiras e os impactos das concessões de serviço público.
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O episódio 48 do podcast Sem Precedentes faz uma análise sobre a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020 e mostra o que esperar em 2021. Ouça:
https://youtu.be/-hMj5lwWXEE
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Temas como equilíbrio das concessões e modicidade tarifária são inseridos nesse contexto também.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Atualmente, metodologia semelhante já aplicada no setor privado. Certas empresas de varejo estimulam o arredondamento de preços que gerem “troco quebrado”. Os valores excedentes são encaminhados para organizações não governamentais que desenvolvem projetos sociais e educacionais. Cita-se, nesse sentido, o projeto “arredondar”, que já conta com a participação de diversas multinacionais. Um regime de transparência assegura ao consumidor o acompanhamento dos recursos aplicados. Disponível em: <a href="https://www.arredondar.org.br/marcas/" target="_blank" rel="noopener noreferrer">https://www.arredondar.org.br/marcas/</a>. Acesso em 17 de fevereiro de 2020. No mesmo sentido, a concessionária CCR (operadora de diversas rodovias no Estado de São Paulo), permite o arredondamento de trocos, destinando seus recursos ao Instituto Ayrton Senna. O arredondamento, entretanto, deve ser feito de forma voluntária. Disponível em: <a href="http://www.aperteparaeducar.com.br/" target="_blank" rel="noopener noreferrer">http://www.aperteparaeducar.com.br/</a>. Acesso em 17 de fevereiro de 2020.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a>Veja-se: <a href="http://www.b3.com.br/pt_br/market-data-e-indices/indices/indices-de-sustentabilidade/indice-de-sustentabilidade-empresarial-ise.htm" target="_blank" rel="noopener noreferrer">http://www.b3.com.br/pt_br/market-data-e-indices/indices/indices-de-sustentabilidade/indice-de-sustentabilidade-empresarial-ise.htm</a>. Consulte-se também: <a href="https://epoca.globo.com/ciencia-e-meio-ambiente/blog-do-planeta/noticia/2017/12/premio-epoca-empresa-verde-destaca-empresas-com-estrategias-ambientais.html" target="_blank" rel="noopener noreferrer">https://epoca.globo.com/ciencia-e-meio-ambiente/blog-do-planeta/noticia/2017/12/premio-epoca-empresa-verde-destaca-empresas-com-estrategias-ambientais.html</a>. Acesso em 17 de fevereiro de 2020.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> Essa integração, inclusive, faz parte de recentes movimentos legislativos que estimulam a monetização de atividades conservação ambiental (estimulando sua potencialização). No início deste ano, foi sancionada a Lei federal nº 14.119/2021, que institui a “Política Nacional de Pagamentos por Serviços Ambientais”. O diploma incentiva a instituição de incentivos ambientais permitindo, dentre suas medidas, a emissão de títulos verdes (Green Bonds) que podem ser comercializados no mercado.

Conservação da floresta Amazônica

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JOTA

Uma fonte potencial de recursos para a conservação ambiental

O arrendondamento das tarifas nas concessões

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