Opinião e Análise

Warley Brant Pimentel

Respirar tornou-se difícil para muitos brasileiros nas últimas semanas. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou quase 50 mil focos de incêndio na primeira metade do mês de setembro.
Um levantamento da Confederação Nacional de Municípios (CNM) estima que <a href="https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2024-09/incendios-podem-ter-afetado-mais-de-11-milhoes-de-pessoas-no-brasil">11 milhões de pessoas que habitam 538 municípios que decretaram emergência</a> estejam dentre as mais afetadas pelos incêndios. Inclusive em capitais, a fumaça vem cobrindo o céu há dias e a baixa umidade se agravou. Um dos casos mais graves se dá em <a href="https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2024/09/21/apos-mais-de-cinco-meses-de-estiagem-volta-a-chover-em-belo-horizonte.ghtml">Belo Horizonte, que enfrentou uma estiagem de cinco meses até o dia 22 de setembro.</a>
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É o maior número de focos de incêndio no país desde 2007 e isso significa um desafio para o <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/governo-lula">governo Lula</a>, que busca se destacar como uma referência no combate ao desmatamento e para isso conta com a ministra do Meio Ambiente, <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/marina-silva">Marina Silva</a>, vista como uma referência global na área.
Além disso, algumas medidas vêm sendo tomadas: o <a href="https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2024-09/governo-anuncia-r-514-milhoes-para-combater-incendios-florestais">orçamento</a> destinado a combater incêndios florestais passou de R$ 60 milhões em 2022 para R$ 89,4 milhões em 2023 e R$ 111,3 milhões em 2024, atingindo R$ 514 milhões na atual conjuntura, em que créditos extraordinários foram liberados com a autorização do Supremo Tribunal Federal (STF). Enquanto isso, a Polícia Federal investiga suspeitas de incêndios criminosos.
Ao que tudo indica, o país está diante da combinação de dois fatores: o agravamento da crise climática, que não é apenas nacional, e ações criminosas intencionais, algumas possivelmente coordenadas, cujas finalidades, para além do desmatamento, também envolvem o garimpo e a expulsão de comunidades tradicionais.
Sendo assim, é preciso pensar a dimensão desses fatores a partir de dois fatores: o primeiro de longo prazo, que perpassa diferentes administrações, e o segundo, o do tempo presente, que se torna um problema não só do governo federal, mas também das outras instâncias administrativas.
O primeiro fator, o de longo prazo, aponta para uma questão estrutural de nossa realidade: o agravamento da crise climática, resultado de práticas de destruição ambiental, vem se manifestando na elevação das temperaturas e as tragédias ambientais. Os crimes ambientais e sua relação com a violência contra comunidades indígenas tampouco são novidade.
Atrelada a essas questões reside a falsa associação entre progresso, produção e agressão ao meio ambiente e a tudo que o cerca. Neste ponto, há ingerências de governos à esquerda — não se deve esquecer da problemática construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, a segunda maior do mundo, localizada na bacia do rio Xingu, obras dos governos do PT — e à direita — toda a tragédia ambiental que marcou o governo de Jair Bolsonaro (PL), claramente favorável ao garimpo e à exploração predatória do território.
Nos últimos anos, no entanto, as pressões pela preservação do meio ambiente vêm se tornando mais contundentes. Nesse contexto, cabe lembrar que a campanha de Lula em 2022 teve como um de seus eixos principais a necessidade de enfrentamento de mudanças climáticas. A criação do Ministério dos Povos Indígenas veio ao encontro dessas promessas, principalmente quando se faz necessário relacionar a preservação ambiental com a das culturas e modos de vida dos povos originários.
É preciso sempre relacionar estes dois elementos, não só porque esta posição está de acordo com uma concepção de sociedade mais justa e plural, com o respeito às diversidades garantido, mas também porque, em alguns momentos, uma concepção equivocada a respeito dos povos originários os colocou como responsáveis por crimes que buscam justamente os atingir. Por exemplo, quando uma onda de incêndios devastou o país em 2020, <a href="https://www.brasildefato.com.br/2020/09/22/bolsonaro-culpa-indios-caboclos-midia-e-ongs-por-queimadas-e-consequencias-da-covid">o então presidente Bolsonaro culpou indígenas e ONGs por queimadas criminosas</a>.
Nesse aspecto, o descaso ambiental que marcou o governo Bolsonaro e a inserção do atual governo Lula em um tempo no qual o meio ambiente passou a ocupar um lugar cada vez mais central no campo das preocupações políticas, impõe à atual administração a urgência de passar das medidas simbólicas para a ação concreta. Ainda que a aplicação de mais recursos no combate ao desmatamento seja fundamental, é preciso ir além.
Com as queimadas em evidência, Marina Silva tem defendido uma punição mais severa para os criminosos ambientais. A ministra também acredita na possibilidade de estruturar planos de prevenção e controle do desmatamento, que possam reduzir o impacto causado no meio ambiente.
A situação do Ministério do Meio Ambiente é complicada, pois as contradições que envolvem a exploração de recursos naturais e preservação do meio ambiente encontram eco no próprio governo, como é possível ver na defesa da exploração de petróleo na Bacia da Foz do Amazonas, defendida pelo próprio Lula.
No plano externo, a defesa por medidas rígidas de combate ao crime ambiental enfrenta o interesse de grandes empresas, do agronegócio e de grileiros que se instalam em áreas de difícil atuação por parte do governo. Pesa o fato de que nos quatro anos de governo Bolsonaro os principais órgãos de combate aos crimes ambientais foram desmantelados, visto o interesse do ex-presidente em atender às elites políticas e econômicas que não se ajustaram a um novo padrão de política ambiental — e nem pretendem fazê-lo.
As queimadas que se alastraram pelo país nas últimas semanas são apenas um sintoma de um mal que nos acomete há muito tempo. O governo Lula salta de cabeça em meio a uma série de contradições e problemas que se estenderão em administrações futuras. Apenas melhorar o que já estava muito mal não basta.
O tempo da natureza tem suas urgências e precisamos entender que para o planeta não somos prioridade. Na verdade, no tempo presente estamos sendo o problema. Marina Silva tem razão: é preciso punir os crimes ambientais de forma mais severa e elaborar novos métodos de prevenção e combate aos desmatamento. Mas é preciso fazer isso já.

queimadas Amazônia Pantanal STF

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JOTA

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