Mariana Muniz
Repórter
Em caso envolvendo a AmBev, STJ rejeita aplicação por analogia de lei que rege venda de veículos
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reforçou que a Lei 6.729/1979 – a Lei Ferrari - não pode ser aplicada por analogia aos contrato de distribuição de bebidas. A norma estipula as obrigações do fabricante e das concessionárias de veículos, além de restringir a liberdade das partes contratantes nesses casos.
Com a interpretação, o colegiado reformou decisão que condenava a fabricante de bebidas Ambev a indenizar uma distribuidora por parte de seu fundo de comércio, correspondente à captação de clientela.
No caso tratado pelo Recurso Especial 1.320.870/SP, a distribuidora Copebel entrou com ação indenizatória em 1998 contra a Indústria de Bebidas Antárctica do Sudeste S.A, que foi incorporada pela Ambev. O objetivo era obter uma reparação por danos materiais e morais supostamente suportados em virtude da ruptura unilateral do contrato de distribuição mantido desde 1986.
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Embora o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) tenha afastado as condenações da Ambev ao pagamento de indenizações por danos morais e lucros cessantes, manteve a obrigação da fabricante pagar indenização parcial por fundo de comércio, correspondente à captação de clientela.
Para a Trigésima Câmara de Direito Privado do tribunal paulista, “dissolvido o vínculo contratual, ainda que em decorrência de denúncia motivada por inadimplemento culposo da distribuidora, tem ela direito a uma indenização de natureza compensatória, cuja finalidade é evitar o enriquecimento sem causa do fabricante, único a continuar se beneficiando da incorporação do fruto do trabalho de captação da clientela promovido pelo distribuidor”.
Analogia
Foi justamente contra esta condenação – embasada na Lei Ferrari – que a Ambev recorreu ao STJ. O relator do caso, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, deu razão à fabricante. “O acórdão recorrido destoou da jurisprudência desta Corte Superior ao considerar incidente, por analogia, a Lei 6.729/1979 no caso em espécie. ”
É que, segundo o ministro, é firme nas duas turmas de direito privado do STJ a orientação de que é impossível aplicar, por analogia, as disposições contidas na Lei 6.729/1979 à hipótese de contrato de distribuição de bebidas. Isto porque a norma é bastante específica, na visão dos julgadores.
“Nesse cenário, afigura-se evidente o desacerto do acórdão recorrido que, apesar de ter reconhecido a licitude da denúncia motivada do contrato levada a efeito pela ora recorrente, não aplicou bem o direito à espécie quando concluiu ser procedente em parte o pleito indenizatório autoral (impondo à fabricante, mediante descabida aplicação da Lei Ferrari por analogia, o pagamento de indenização de natureza compensatória por suposta captação da clientela que a autora da demanda teria, ao longo dos anos, ajudado a construir)”, considerou Cueva.
O ministro ressaltou que a Ambev denunciou o contrato oportunamente, deixando ciente a distribuidora Copebel de que não tinha mais interesse na manutenção do contrato firmado. “Cumpre ressaltar que a denúncia, nesse caso, foi motivada, ou seja, a ruptura do negócio está fundada em justa causa e não em ato de mera liberalidade da fabricante”, afirmou.
De acordo com o relator, o TJSP, ao concluir pela parcial procedência do pedido formulado pela distribuidora – para condenar a fabricante ao pagamento de suposta "indenização de clientela" em virtude da ruptura motivada da relação contratual que mantinham – usou orientação completamente dissonante da que vem sendo aplicada pelo STJ sobre o tema.
“Tanto é assim que a 3ª Turma, no julgamento de controvérsia análoga a que ora se afigura, deixou assente que a não renovação de contrato de contrato de distribuição de bebidas e/ou alimentos, após expirado seu termo final, com amparo e perfeita observância de expressa e válida cláusula que assegura a ambas as partes contratantes o direito de não mais prorrogar tal relação, não constitui ato ilícito gerador do dever de indenizar”, sustentou o ministro, em referência ao julgamento do REsp 1.494.332/PE, em agosto de 2016.
Assim, por unanimidade de votos, os ministros da 3ª Turma acolheram a argumentação do relator e deram provimento ao recurso especial da AmBev. Consideraram, assim, não haver nada que justifique a pretensão de indenização da Copebel. A distribuidora ficou condenada ao pagamento das despesas processuais e de honorários advocatícios sucumbenciais.