O Supremo Tribunal Federal (STF) continua nesta quarta-feira (20/10) o julgamento sobre a constitucionalidade artigos da reforma trabalhista que alteram elementos da justiça gratuita. A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) é um dos amici curiae que atuam na ADI 5.766 e defende que os artigos não limitam o acesso ao Poder Judiciário. Para a CNA, esse trecho da lei visa a apenas impedir ações judiciais desnecessárias e temerárias.
O chefe da Assessoria Jurídica da CNA, Rudy Maia Ferraz, disse ao JOTA não ser razoável que a parte derrotada não arque com as obrigações processuais. “A disposição da norma busca evitar a propositura de lides temerárias e fazer do Poder Judiciário mero administrador de demandas inoportunas”, afirmou.
O Supremo vai decidir a constitucionalidade de artigos da CLT inseridos na reforma trabalhista, que responsabilizam a parte sucumbente (vencida) pelo pagamento de honorários periciais, custas judiciais, honorários de sucumbência, ainda que beneficiária da justiça gratuita. O placar está 2 votos a um a favor da manutenção das alterações trazidas pela reforma de 2017.
Leia a entrevista com o chefe da Assessoria Jurídica da CNA:
Na sua opinião, qual é a tendência desse julgamento no STF? Será um placar apertado ou não?
É um julgamento no qual os ministros se debruçarão principalmente nas teses já expostas, de modo que a definição seguindo o voto do ministro Luís Roberto Barroso ou do ministro Edson Fachin tende a provocar um debate no Plenário. Contudo, acreditamos que prevaleça a tese que defendemos (constitucionalidade dos artigos 790-B, caput e parágrafo 4º; 791-A, parágrafo 4º; e 844, parágrafo 2º, da CLT).
Os artigos impugnados pela Procuradoria-Geral da República na ação estabelecem restrições inconstitucionais à garantia de gratuidade de justiça?
É necessário analisar o caso sob a ótica da isonomia e da necessidade de eficiência e financiamento do Poder Judiciário. É fato que a total imunidade às obrigações pecuniárias processuais é um desequilíbrio que tende a incentivar demandas temerárias diante da ausência de receio dos ônus oriundos da atuação. Não é razoável que a parte sucumbente (total ou parcialmente) não arque com as obrigações processuais daí decorrentes, mesmo que tenha obtido em Juízo – ainda que em outro processo – créditos para tanto suficientes. Note-se que no âmbito cível, verificada a alteração da situação econômica, a gratuidade de Justiça é afastada, e o sucumbente arca com o pagamento dos ônus sucumbenciais.
A lei é de 2017. De lá para cá, ficou mais restrito o acesso dos mais pobres?
Veja-se, não se está limitando o acesso ao Poder Judiciário. As normas questionadas produzem efeitos ao final do processo. E, no caso do não comparecimento à audiência, a condenação do reclamante ao pagamento das custas pode ser afastada caso ele apresente motivo legalmente justificável a sua ausência. O acesso à jurisdição está completamente mantido. Ademais, cabe lembrar que o pagamento dos ônus de sucumbência, por beneficiário da gratuidade judiciária, está atrelada a eventual obtenção de crédito em Juízo, ainda que em outro processo. Portanto, não se mostra adequado se falar em restrição.
Nesse período, foi possível observar alguma diminuição a judicialização ou se a judicialização ficou mais efetiva?
Pelo último Relatório Justiça em Números, do CNJ, observa-se que, em 2017 e 2018, a carga de trabalho dos magistrados trabalhistas não diminuiu. Contudo, em 2019 e 2020, verifica-se uma queda, mas essa queda tem que ser analisada sob o prisma da pandemia, que tem impacto na Justiça do Trabalho, em que as audiências são atos processuais importantíssimos. Mas há que se considerar também, é claro, a possibilidade de uma maior ponderação prévia à propositura de ações trabalhistas, face à condenação aos ônus sucumbenciais em caso de improcedência (ainda que beneficiário da Justiça Gratuita), o que certamente serviu – e serve – como um freio à propositura de lides temerárias, que inflavam as pautas trabalhistas.
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Que tipo de consequência teve a demora neste julgamento?
Será possível aferir a exata consequência com o término do julgamento, a partir do entendimento firmado. Ressalte-se, hoje já temos duas posições, sem prejuízos de outras que venham a ser exaradas.
Caso o STF decida pela inconstitucionalidade dos artigos, como fica a situação dos trabalhadores beneficiários da Justiça gratuita que foram parte vencida e ficaram responsáveis por pagar os honorários periciais?
Será necessário avaliar se já houve ou não o pagamento dos honorários, e até mesmo se o STF irá modular a decisão. Cada caso terá uma solução na hipótese de declaração de inconstitucionalidade, de interpretação conforme a Constituição ou de total improcedência da ação.