Guilherme Pimenta

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgou relatório no qual classifica acusações formuladas em face da JBS, do banco BTG Pactual, da Petrobras e da corretora XP Investimentos como "casos emblemáticos" este ano. Os processos têm potencial para serem julgados em 2018 pelo colegiado da autarquia.
Na tarde da última terça-feira (27/3), o órgão regulador do mercado de capitais divulgou a 2ª Edição do<a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2018/03/relatorio_atividade_sancionadora_2017_janeirodezembro.pdf" target="_blank" rel="noopener"> Relatório de Atividade Sancionadora</a>. A publicação é uma das bandeiras do presidente da autarquia, Marcelo Barbosa, desde que assumiu a CVM, em setembro de 2017. A intenção é dar mais publicidade às decisões e a números sancionadores.
De acordo com o anexo 9 do relatório, a CVM informa que "vale ressaltar alguns casos emblemáticos de Processos Administrativos Sancionadores (PAS) que foram instaurados (mas ainda não julgados)". A autarquia selecionou nove processos que "chegaram ao final de apuração ou investigação e resultaram em acusações formuladas pelas áreas técnicas que os conduziram". O próximo passo, após as defesas serem ouvidas, é levar os casos a julgamento, o que ainda não há previsão de ocorrer.
Desses nove casos, dois referem-se ao suposto insider trading cometido pela JBS e seus administradores. Em um deles, a Superintendência de Processos Sancionadores (SPS) da CVM acusou a FB Participações e os irmãos Batista por terem vendido ações de emissão da JBS S.A. ao estarem de posse de informação privilegiada, "abusando de poder de controle ao beneficiar-se em detrimento dos demais acionistas, além de ter concorrido para a prática de manipulação de preços que evitou a queda do valor das ações durante as vendas".
No outro caso referente à JBS, a acusação da SPS à companhia se dá por supostamente ter negociado contratos futuros de dólares antes da divulgação da delação premiada negociada entre Joesley e Wesley Batista com a Procuradoria-Geral da República (PGR), que acusou o presidente Michel Temer (PMDB) e derrubou o mercado de capitais nos dias subsequentes.
Outro caso tido pela CVM como "emblemático" é o suposto <a href="https://www.jota.info/justica/spoofing-nova-forma-de-manipular-o-mercado-de-acoes-03092017" target="_blank" rel="noopener">spoofing </a>praticado pelo banco BTG Pactual e a Garde Asset Management Gestão de Recursos. O caso começou após apuração do autorregulador, a BM&amp;FBovespa Supervisão de Mercados (BSM). Na autarquia, está sob relatoria do diretor Gustavo Borba. A Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários (SMI) da CVM acusou o banco e a gestora por manipulação de mercado.
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Dois processos relacionados à Petrobras também estão no rol de "casos emblemáticos" do regulador do mercado de capitais. O primeiro, oriundo da operação Lava Jato, trata-se da acusação de suposta falta do "devido dever de lealdade pelo afretamento do navio-sonda, em troca de vantagens indevidas" sobre o afretamento do navio-sonda Titanium Explorer e o ex-diretor da área internacional Jorge Luiz Zelada.
O segundo, também ligado à operação Lava Jato, diz respeito à "suposta inobservância de deveres fiduciários de administradores da Petrobras no que concerne à contratação de construção dos navios-sonda Petrobras 10.000, Vitória 10.000 e Pride DS-5". O ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli e demais membros da diretoria foram acusados pela SPS e pela Procuradoria-Federal Especializada da CVM.
Os casos da Petrobras ligados à Lava Jato levam a críticas por parte do mercado à CVM. Segundo advogados e pesquisadores, a autarquia demora ao dar uma resposta às supostas infrações cometidas pela estatal quando comparada a outros órgãos, tanto no âmbito administrativo quanto ao Judiciário.
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No caso da XP Investimentos, a corretora e o diretor Guilherme Benchimol estão sendo acusados por suposta "inadequação do sistema de registro de ordens da corretora", Segundo a SMI, "agentes autônomos prepostos da corretora haviam entrado em contato com os seus clientes com o fim específico de obter a confirmação posterior das ordens solicitadas, deixando claro que a XP não arquivou ou não foi capaz de recuperar em tempo razoável as solicitações prévias emitidas pelos clientes".
Elogios e críticas
Advogados atuantes em processos administrativos sancionadores perante à CVM ouvidos pelo JOTA destacam a importância do relatório, mas demonstram descontentamento com relação à exposição de casos não julgados, além do uso de termos como "emblemáticos" e "responsabilizados".
Sob a condição de anonimato, alguns advogados afirmaram que a autarquia deveria ter utilizado termos neutros, como "suposto insider trading", ou então deixado claro em cada caso relatado que se tratava de uma "acusação pela área técnica", em vez de ter reproduzido os termos da acusação na íntegra.
Além disso, na visão de pessoas atuantes nos processos, o uso da terminologia pode até gerar, no limite, questionamentos processuais, tanto no Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN) quanto no Judiciário, por suposta "falta de imparcialidade da autarquia".
Na visão do advogado Marcelo Trindade, ex-presidente da CVM, o leitor que é do ramo entende que no contexto trata-se de acusações. O problema, segundo ele, “ao chamar acusações não julgadas de emblemáticas e falar em responsabilidade dos acusados, o texto esmaece a segregação entre o órgão que acusa (área técnica) e o órgão que julga (Colegiado)".
"Segregação essa que foi estabelecida em 2003, na presidência do saudoso [Luiz Leonardo] Cantidiano [ex-presidente da autarquia que faleceu em 2017], e há 15 anos assegura a independência da palavra final do Colegiado da CVM", lembrou Trindade.
Na mesma linha vai o advogado Henrique Vergara, ex-procurador da CVM, atualmente atuante em processos sancionadores. "O relatório é uma ótima medida de transparência, que permite dar uma dimensão mais precisa à atividade sancionadora", afirmou. Porém, para ele, não deveriam dizer que o PAS instaurado "resultou na responsabilização", pois passa a "falsa impressão de que o processo já foi julgado".
Quem discorda dessa avaliação é Daniel Kalansky, sócio do Loria e Kalansky Advocacia, especialista em mercado de capitais. Para ele, o relatório "deixa claro que se trata de processos ainda não julgados". "Demonstra o caminho da transparência e do trabalho de enforcement que a CVM está fazendo, seja do que julgou como do que já tem acusação formulada", afirmou o advogado.
O presidente da CVM, Marcelo Barbosa, afirmou que a "publicação deste material tem por objetivo apresentar, de forma organizada, o trabalho desenvolvido pela CVM a fim de facilitar não só o acompanhamento pelo público, como também uma melhor compreensão dos nossos procedimentos e formas de atuação".
"É uma maneira de demonstrarmos como desempenhamos na prática nosso mandato legal de assegurar a proteção dos investidores e o desenvolvimento do mercado de capitais”, falou Barbosa.

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JOTA

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