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O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), atendeu pedido da Polícia Federal (PF) na investigação da chamada “Abin paralela” e decretou a prisão de cinco investigados, além de autorizar buscas para apuração sobre o monitoramento ilegal de pessoas e autorizar afastamentos da função. Entre os alvos do monitoramento ilegal estão os ministros do STF Dias Toffoli, Luis Roberto Barroso, Luiz Fux e Moraes, além de deputados, senadores e jornalistas (veja a relação completa dos alvos abaixo).
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Na operação desta quinta-feira (11/7), a PF prendeu agentes que trabalhavam diretamente para Alexandre Ramagem, atual deputado federal, pré-candidato do PL à Prefeitura do Rio de Janeiro e ligado ao vereador Carlos Bolsonaro. Os policiais cumprem também cinco mandados de prisão preventiva e sete mandados de busca e apreensão expedidos pelo STF em Brasília, Curitiba, Juiz de Fora, Salvador e São Paulo.
A decisão de Moraes foi tomada nos autos da Petição (PET) 12.732, que investiga o uso indevido do sistema de inteligência First Mile, da Abin, por delegados, agentes e servidores públicos. O sistema, fornecido pela empresa “COGNYTE BRASIL S.A.”, seria capaz de indicar a localização de qualquer celular monitorado.
Segundo o ministro, a investigação da PF identificou a existência de uma organização criminosa com intuito de monitorar ilegalmente pessoas e autoridades públicas, invadindo aparelhos e computadores, além da infraestrutura de telefonia, entre os anos de 2019 e 2022.
A polícia relatou que o grupo atuava para elaborar dossiês contra ministros, parlamentares e outras pessoas de interesse a fim de divulgar narrativas falsas e incitar uma tentativa de golpe de estado e enfraquecimento das instituições democráticas.
“Os investigados, segundo a Polícia Federal, participaram de uma estrutura espúria infiltrada na Abin voltada para a obtenção de toda a ordem de vantagens para o núcleo político, produzindo desinformação para atacar adversários e instituições que, por sua vez, era difundida por intermédio de vetores de propagação materializados em perfis e grupos controlados por servidores em exercício na Abin”, destacou Alexandre de Moraes na decisão.
O ministro afirmou que as condutas dos investigados, conforme narrado pela PF, são gravíssimas e constituem “ameaça à segurança de autoridades públicas” para obtenção de vantagens econômicas e políticas. Moraes também disse que as investigações mostram que as ações em questão “ensejaram, motivaram e causaram, direta ou indiretamente, a tentativa de Golpe de Estado ocorrida em 08 de janeiro de 2023, que pretendia abolir nosso Estado Democrático de Direito e instituir uma Ditadura”.
A Procuradoria-Geral da República (PGR), em parecer enviado sobre o caso, também indicou que os elementos apresentados apontam a existência de uma organização que pretendia atacar o sistema republicano.
“Os elementos condensados na representação policial revelaram que a estrutura infiltrada na Agência Brasileira de Inteligência representava apenas uma célula de organização criminosa mais ampla, voltada ao ataque de opositores, instituições e sistemas republicanos. As ações do grupo criminoso não se esgotam em um único inquérito, sendo importante o compartilhamento de provas para o melhor enquadramento das condutas praticadas”, escreveu a PGR.
Prisões, afastamentos e compartilhamento de dados
Moraes decretou a prisão preventiva e o afastamento de cargos públicos de cinco investigados: Mateus de Carvalho Sposito, Ricards Dyer Pozzer, Rogério Beraldo de Almeida, Marcelo Araújo Bormevet e Giancarlo Gomes Rodrigues. O ministro concordou com os argumentos da PF de que era necessário decretar prisão e o afastamento dos cargos públicos para evitar que os investigados dificultem a colheita de provas e obstruam a instrução criminal.
O ministro também autorizou o compartilhamento das investigações com outras apurações em curso no STF nos Inquéritos 4.781/DF, 4.828/DF e 4.874/DF, que apuram a veiculação de narrativas falsas e tentativas de desestabilizar o sistema eleitoral brasileiro.
Ainda a pedido da PF e com parecer favorável da PGR, Moraes autorizou buscas em relação a sete investigados: Mateus De Carvalho Sposito, José Matheus Sales Gomes, Daniel Ribeiro Lemos, Richards Dyer Pozzer, Rogério Beraldo De Almeida, Marcelo Araújo Bormevet e Giancarlo Gomes Rodrigues.
Moraes também determinou a proibição da comunicação entre os investigados em inquéritos que correm no STF.
Quanto ao pedido para compartilhar provas com a Corregedoria da Abin, o ministro negou o pedido “por entender que a medida não é adequada para o presente momento investigatório.”
Organização dentro da Abin
Na decisão do ministro, ele traz trechos da investigação da Polícia Federal que indicam que a organização criminosa dentro da Abin se dividia em diversos núcleos de atuação. O primeiro era o núcleo PF, que se subdividia entre “alta gestão” e “subordinados”.
Na alta gestão, que seria formada por Ramagem e Carlos Afonso Gonçalves (delegado federal e secretário de planejamento e gestão), os delegados federais cedidos para a Abin utilizavam o sistema First Mile para monitorar alvos e autoridades públicas, criando relatórios para construção de narrativas falsas.
“A Polícia Federal esclareceu acerca da atuação do “Núcleo de Alta Gestão” da ABIN, que detinha o poder de direcionamento das condutas dos demais, com pleno conhecimento do desvirtuamento do uso da ferramenta de inteligência First Mile e que teria tentado dar uma aparência de legalidade na sua utilização, bem como impedir a apuração correicional sobre condutas ilícitas”, escreveu Moraes.
Já no núcleo dos subordinados, policiais federais cedidos para a Abin atuavam como funcionários da alta gestão, cumprindo ordens, monitorando alvos e produzindo relatórios.
A polícia encontrou indícios da atuação de seis pessoas nesse núcleo: Marcelo Araujo Bormevet (servidor e secretário de planejamento e gestão), Felipe Arlotta Freitas (policial federal), Carlos Magno De Deus Rodrigues (policial federal), Henrique César Prado Zordan (policial federal), Alexandre Ramalho (policial federal), Luiz Felipe Barros Felix (policial federal).
Outro núcleo descrito pela polícia é o chamado “núcleo evento portaria 157”, que seria responsável pelas diligências que resultaram na tentativa de vinculação de parlamentares e ministros do Supremo à organização criminosa PCC. A polícia diz ter identificado cinco integrantes: Ottoney Braga Dos Santos, Thiago Gomes Quinalia, Renato Pereira De Araujo, Rodolfo Henrique Da Silva Do Nascimento e Ricardo Wright Minussi Macedo.
Por fim, o “núcleo tratamento Log”, cujo único membro seria Bruno de Aguiar Faria, era responsável por tratar os dados de acesso ao sistema disponíveis desde o início da investigação.
Fora da Abin, a Polícia Federal informou ao Supremo ter localizado outros possíveis agentes (Mateus De Carvalho Sposito, Daniel Ribeiro Lemos e José Matheus Sales Gomes), à época servidores da Presidência da República, que integrariam o núcleo responsável por viabilizar, em tese, o contato entre os núcleos de desinformação com o então presidente da República, Jair Bolsonaro.
Alvos da organização criminosa
As investigações, segundo Moraes, apontam que a alta direção da Abin, exercida por policiais federais cedidos ao órgão durante a gestão do então Diretor-Geral Alexandre Ramagem Rodrigues, teria instrumentalizado a agência para monitorar alvos de interesse político e autoridades públicas sem a necessária autorização judicial.
A Polícia Federal indicou, de acordo com o ministro do Supremo, que as ações de monitoramento eram, no geral, direcionadas contra opositores do núcleo político, que seria o único beneficiário da desinformação produzida pelo núcleo de estrutura paralelo. Como exemplo, a PF cita o fato de que os investigados Luiz Gustavo e Giancarlo Rodrigues utilizaram o sistema First Mile para monitorar o ex-deputado federal Jean Wyllys e seus familiares.
A PF encontrou alvos de monitoramento no Executivo, Legislativo, Judiciário e na imprensa. Na Justiça, os alvos foram os ministros do STF Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luis Roberto Barroso e Luiz Fux.
Na Câmara, foram os deputados federais Arthur Lira (presidente da Câmara dos Deputados), Rodrigo Maia (então Presidente da Câmara dos Deputados), Kim Kataguiri e Joice Hasselmann. No Senado, os senadores Alessandro Vieira, Omar Aziz, Renan Calheiros e Randolfe Rodrigues.
No Executivo, os alvos foram o ex-governador de São Paulo João Doria; os servidores do Ibama Hugo Ferreira Netto Loss e Roberto Cabral Borges; os auditores da Receita Federal Christiano José Paes Leme Botelho, Cleber Homen da Silva e José Pereira de Barros Neto.
Na imprensa, foram monitorados os jornalistas Monica Bergamo, Vera Magalhães, Luiza Alves Bandeira e Pedro Cesar Batista.
A Polícia Federal destacou alguns episódios que evidenciam a atuação da organização. Um deles foi quando o gestor do Sistema First Mile, Paulo Magno, teria sido flagrado pilotando um drone nas proximidades da residência do então Governador do Ceará, Camilo Santana.
Outro episódio destacado foi o caso em que os policiais federais utilizaram ferramentas e serviços da agência para interferir em diversas investigações da PF, como, por exemplo, para tentar produzir prova a favor de Renan Bolsonaro, filho do então presidente Jair Messias Bolsonaro.
Igualmente, em relação às investigações relacionadas ao senador Flávio Bolsonaro, a PF trouxe informações que mostram que a Abin foi utilizada para monitorar os auditores da Receita responsáveis pelo relatório que deu origem à investigação sobre o caso da “rachadinha” de parte dos salários dos funcionários da Alerj.
Moraes também cita na decisão que a Abin teria sido utilizada para monitorar a promotora de Justiça do Rio de Janeiro e coordenadora da força-tarefa sobre os homicídios da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.