O advogado-geral da União (AGU), Bruno Leal Bianco, afirmou que o governo deve reverter o julgamento conhecido da revisão da vida toda no Supremo Tribunal Federal (STF). “Estou convicto que nós conseguiremos nos consagrar vencedores nessa tese”, disse Bianco durante entrevista ao Programa Sem Censura, da TV Brasil, nesta segunda-feira (28/4). A repórter Flávia Maia, responsável pela cobertura de STF do JOTA, foi uma das entrevistadoras.
De acordo com o AGU, a instituição de um marco temporal para contagem da aposentadoria, que é combatida no processo da revisão da vida toda, é constitucional. “Não conversei com nenhum ministro sobre isso, não sei quem mudará o seu voto, mas o que eu posso adiantar é que certamente a AGU fará a defesa da constitucionalidade da norma para garantir a segurança jurídica, para que possamos ser um país com tranquilidade e de pacificação social. A gente joga contra a pacificação social sempre que jogamos contra esse tipo de regras consolidadas no jogo”, argumentou.
Bianco também afirmou que não vislumbra acordos entre o INSS e os aposentados porque envolvem muitas revisões. “São milhões de supostas revisões que seriam feitas e isso impactaria no INSS do ponto de vista institucional e traria consequências, na minha ótica, inimagináveis. Essas consequências prejudicariam o dia a dia do INSS e estamos convictos que essa tese [da revisão da vida toda pró-aposentado] não prospera”, afirmou.
Bianco também defendeu a postura do ministro Nunes Marques de reiniciar o julgamento em plenário físico mesmo após o voto dos 11 ministros sobre a questão em ambiente virtual. Para o AGU, o regimento interno do STF prevê a possibilidade do pedido de destaque e reinício do julgamento, além disso, em sua opinião, o tema da revisão da vida toda é muito sensível e importante para o governo federal e aposentados, portanto, precisa ser discutido em plenário virtual.
De acordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e nota técnica do Ministério da Economia, o impacto de autorizar a ‘revisão da vida toda’ para os cofres públicos é de R$ 46,4 bilhões ao longo de dez anos. No último dia de votação em plenário virtual, 9 de março de 2022, a União atualizou os cálculos do impacto aos cofres públicos para R$ 360 bilhões em 15 anos.
O grupo “Lesados pelo INSS Revisão da Vida Toda” contesta a previsão do órgão federal e contratou estatísticos e matemáticos, que estimam impacto econômico entre R$ 2,7 bilhões e R$ 5,5 bilhões nos gastos federais com Previdência, conforme a mediana do indicador de inflação.
Com o reinício do julgamento, o voto do relator Marco Aurélio Mello pode não ser aproveitado e o novo ministro, André Mendonça, ex-AGU, poderá votar e alterar o placar. Mas alguns ministros consideraram o destaque como uma tentativa de manipular o resultado do julgamento.
A defesa do aposentado Vanderlei Martins de Medeiros e o terceiro interessado Instituto de Estudos Previdenciários (Ieprev) suscitaram questão de ordem no processo para anular o destaque de Nunes Marques e manter o voto do relator original, ministro Marco Aurélio, a favor dos aposentados, mesmo se a discussão for reiniciada.
A íntegra do programa pode ser conferida aqui:
O que é a revisão da vida toda?
Em 1999, foi promulgada a Lei 9.876, uma reforma previdenciária que criou duas fórmulas para apuração da média salarial, sobre as quais são calculadas as aposentadorias. A regra geral definiu que, para trabalhadores que começassem a contribuir a partir de 27 de novembro de 1999, o cálculo da previdência deveria ser sobre 80% dos recolhimentos mais altos desde o início das contribuições.
Mas a mesma lei fixou uma regra de transição para quem já era contribuinte: o benefício deveria ser calculado a partir das contribuições realizadas a partir de julho de 1994 (quando foi instituído o Plano Real). No STF, os segurados visam uma revisão, para incluir nos cálculos todo o período de contribuição do segurado, e não só após 1994. Dessa forma, beneficiaria os segurados que tiveram as maiores contribuições antes desse período.
Até 1994, o país tinha uma alta inflação devido às mudanças frequentes de moedas. Naquele ano, foi instituído o Plano Real. A Lei 9.876/1999 então definiu que iriam ser considerados os salários a partir de julho de 1994. No entanto, algumas pessoas tiveram suas maiores contribuições antes de 1994. Então quando elas começaram a se aposentar depois disso, tiveram benefícios menores do que poderiam ter. E muitas pessoas passaram a entrar no Judiciário para pleitear que a aposentadoria considerasse todo o histórico contributivo, e não apenas de 1994 para frente.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, em 2019, pela validade da “revisão da vida toda”, autorizando que, quando mais vantajosa, os segurados teriam direito ao cálculo da média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a 80% de todo o período contributivo, e não só a partir do Plano Real. O INSS recorreu ao STF por meio do recurso extraordinário que está sendo julgado agora.
Na ocasião, o STJ fixou a seguinte tese: “Aplica-se a regra definitiva prevista no art. 29, I e II da Lei 8.213/1991, na apuração do salário de benefício, quando mais favorável do que a regra de transição contida no art. 3o. da Lei 9.876/1999, aos Segurado que ingressaram no Regime Geral da Previdência Social até o dia anterior à publicação da Lei 9.876/1999″.
O julgamento sobre a revisão da vida toda ocorre no RE 1.276.977.