Política Monetária

Ata do Copom coloca ritmo de crescimento em xeque e deve ter consequências

Documento diz que não há mais espaço livre para crescer a um ritmo mais forte porque o Brasil já zerou o ‘hiato do produto’

Ata Copom
Entrada do Banco Central, em Brasília / Crédito: Beto Nociti/BCB

A ata da última reunião do Copom divulgada na manhã desta terça-feira (25/6) indica que o governo vai ter que conviver de fato com juros altos por um bom tempo. Para além da simulação de um cenário com juros constantes em todo o “horizonte relevante” da política (leia-se até o fim do ano que vem), o documento sobre a reunião do colegiado liderado por Roberto Campos Neto traz que o Brasil já não tem mais espaço livre para crescer a um ritmo mais forte porque já zerou o chamado “hiato do produto”.

Outra notícia preocupante para quem deseja juros mais baixos é que o comitê elevou, ainda que marginalmente, o que considera sua “taxa neutra”, aquela que não acelera ou desacelera a economia. Essa variável subiu de 4,5% para 4,75%, mas o BC também já inclui alguns cenários com 5% de juro neutro. Isso na prática coloca um piso de juros maiores no futuro. O Ministério da Fazenda, por exemplo, trabalha com uma taxa neutra de 4% e, por isso, considera em suas projeções juros bem menores do que o mercado em 2025 e 2026.

Ao falar da taxa neutra, o BC voltou a dar recados fiscais e a manifestar outras preocupações com a política econômica, indicando que esse aumento teria relação com a piora na percepção dos mercados sobre o que se desenha no Brasil.

“O Comitê reforçou a visão de que o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação em termos de atividade”, diz o texto.

A ata destaca o cenário externo adverso, com juros altos nos Estados Unidos como um fator que pressiona a política monetária local.

“No ambiente atual de menor liquidez, há potencialmente maior diferenciação entre ativos, aumentando, relativamente, a demanda por ativos mais seguros ou com melhores fundamentos. O Comitê reiterou que não há relação mecânica entre a condução da política monetária norte-americana e a determinação da taxa básica de juros doméstica e que, como usual, o Comitê focará nos mecanismos de transmissão da conjuntura externa sobre a dinâmica inflacionária interna”, diz o texto

É um documento que não permite ao governo sonhar com juros menores no curto prazo e deixa mais amarrada a futura gestão, cujo favorito para liderar é o diretor Gabriel Galípolo (política monetária). Aliás, o documento não dá pistas de que houve discordância dos quatro nomeados por Lula sobre o quadro pintado. Assim, se os juros americanos não dão trégua, a capacidade ociosa da economia desapareceu, o juro neutro está maior, as projeções de inflação do mercado se distanciando da meta e o nível de atividade surpreendendo para cima, a Selic mais baixa parece, no cenário desse atual BC, uma miragem.

É como se a autoridade monetária dissesse que o Brasil não só não vai poder acelerar seu crescimento como, possivelmente, precisará esfriar seu nível de atividade. Isso tem consequências políticas e econômicas.

No político, se Lula já vê em Campos Neto e companhia um inimigo a ser atacado, com esse quadro pintado pelo BC certamente ele vai ficar mais irritado e tende a atirar mais. Haddad, por sua vez, tentou não criar confronto, mesmo com o risco aumentado de os juros subirem mais à frente. “Não tem nada de muito diferente do comunicado, o que é bom, o que transmite a ideia de que está havendo uma interrupção para avaliar cenário interno e externo para que o Copom fique à vontade para tomar decisões a partir de novos dados”, disse o ministro.

Apesar da postura de não confronto do ministro, no front econômico, em um ambiente de juros reais mais altos e esforço para moderar o PIB, o plano fiscal dele vai ficar mais comprometido. Afinal, nesse quadro, a dívida tende a subir mais rápido do que a Fazenda previa. Isso tira espaço de ação do governo, ainda que provavelmente as pressões políticas do petismo para que a política fiscal compense o “conservadorismo” do BC venham a crescer.