Um projeto de lei em tramitação na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) obriga a instalação de sistema de captação de energia solar, por meio de painéis fotovoltaicos ou similares, para os estabelecimentos que possuam área construída dentro do coeficiente horizontal igual ou superior a 1.000 m². O sistema deve atender, no mínimo, 30% do consumo de energia elétrica do imóvel.
Caso aprovada, a medida afetaria shoppings, galpões, prédios, condomínios comerciais, redes hoteleiras, instituições de ensino e de saúde, entre outros. É previsto um prazo máximo de 10 anos para a implantação dos painéis. Após dois anos da eventual sanção da lei, novas construções deverão conter em seus projetos a instalação de tais equipamentos.
A obrigatoriedade não se aplicaria a estabelecimentos que já façam uso de outra fonte de energia renovável e aqueles que comprovem inviabilidade técnica para instalação. Segundo o texto, caberá ao Poder Executivo criar incentivos fiscais à geração de energia solar e estimular investimentos públicos e privados para implantação de painéis fotovoltaicos.
De autoria do deputado Coronel Nishikawa (PL), o Projeto de Lei 423/2021 recebeu parecer favorável na Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR) no último dia 13 de maio e pode ser votado este mês. Se aprovado, o texto ainda terá de passar pelas comissões de Infraestrutura e de Finanças, Orçamento e Planejamento antes de estar apto para ser votado em plenário.
No entanto, o próprio autor vê dificuldades para que a votação ocorra neste ano. “Não faço ideia [se o projeto será apreciado em 2022], mesmo porque esse ano, como é sabido, é ano eleitoral. Realmente não tenho previsão nenhuma disso chegar na Mesa [Diretora]”, comentou Nishikawa em entrevista ao JOTA. Nishikawa também não chegou a dialogar com representantes do Governo do Estado sobre a viabilidade do tema para eventual sanção. “Como é ano eleitoral, se a gente ficar pedindo coisa para o governo, o que vai acontecer: eles vão querer me amarrar. E eu não vou querer. Eu quero liberdade de votar”, explicou.
Tramitação e problemas
A deputada Janaína Paschoal (PRTB) chegou a ser indicada relatora do projeto e, em seu parecer, que não chegou a ser votado, apontou uma série de problemas.
Em seu relatório, Janaína classificava como “constitucionalmente questionável” que o Estado possa criar obrigações tão objetivas aos estabelecimentos privados. Também via como problemático o fato de o projeto acabar englobando unidades do Poder Público, como escolas e hospitais.
Nesse sentido, a parlamentar lembrou o caso do PL 84/2019, do Alagoas, aprovado pela Assembleia Legislativa em maio de 2020 e vetado pelo então governador Renan Filho (MDB). De autoria da deputada Fátima Canuto (MDB), o texto obrigava a instalação de painéis solares em escolas e hospitais da rede pública estadual. O veto chegou a ser derrubado e a lei foi promulgada pelo presidente da Casa em 23 de setembro do mesmo ano. No entanto, nunca foi regulamentada e, portanto, não é colocada em prática.
Esse não é o único caso do gênero. O PL 226/2018, de Santa Catarina, foi aprovado em 11 de maio de 2021 pela Assembleia Legislativa, prevendo a instalação de painéis solares em prédios públicos. Porém, o texto da deputada Ada de Luca (MDB) recebeu veto total do governador Carlos Moisés (Republicanos) por inconstitucionalidade e vício de iniciativa, sendo arquivado posteriormente.
Apesar disso, Nishikawa acredita na constitucionalidade do projeto que apresentou em São Paulo. O substitutivo sugerido por Janaína — e ignorado pelo autor — removia as obrigações e previa que o Poder Executivo criasse incentivos fiscais à geração de energia solar.
“Constitucional é. Agora, se vai ser aprovado ou não, é outra história. A partir do momento que a gente tem uma lei que vai beneficiar o meio ambiente, vai beneficiar o próprio bolso de quem instalou, não tem como ser inconstitucional”, disse. “Acho que se a gente modificar o projeto original, acaba não tendo o efeito que a gente queria”.
Forma de cálculo
Nishikawa aposta que “muita gente vai achar ruim porque, queira ou não, é um custo”. O deputado admite não ter feito um cálculo específico para dimensionar o investimento necessário para os empreendimentos citados em seu projeto.
“Se eu falar hoje que o custo vai ser de R$ 20 milhões, tô chutando… Não fiz esse tipo de cálculo. E outra, depende muito do tamanho de um shopping, do tamanho do hospital, da demanda que cada entidade dessa tenha. O hospital tem os aparelhos que consomem muito, os shoppings têm iluminação constante, escada rolante. Não tem como a gente fazer uma média de cálculo disso”, afirmou.
Além de afirmar que pesquisou sobre o tema e usou exemplos de cidades que já adotaram medidas similares para elaborar o projeto, o parlamentar cita sua experiência pessoal como parâmetro para o sucesso da iniciativa.
“Quando eu mandei colocar [painéis solares] em casa, a gente consumia, naquela época, mais de cinco anos, na faixa de uns R$ 210, R$ 220 por mês. Baixou pra R$ 70, R$ 80. Na instalação, o custo é elevado. Entretanto, o benefício depois de cinco anos… a gente já está colhendo os frutos. Acho que muita gente não vai gostar, porém é uma medida em que, com o tempo, todo mundo vai sair lucrando”, afirmou.
Empresários ligados ao ramo de painéis solares ouvidos pelo JOTA questionaram os critérios do projeto. Um deles — que preferiu não se identificar — não vê sentido na exigência por tamanho do imóvel.
“O que importa pra gente não é a área do local, e sim qual o consumo dele. Teoricamente, quanto maior a área, maior o consumo, mas não é bem assim. Por exemplo, um galpão de armazenamento, que é gigantesco… normalmente o consumo não é tão alto. E existe o contrário. Em alguns casos, pequenas lojas, lanchonetes, gastam muita energia”, comentou.
Algumas empresas do ramo divulgam que, para indústrias e grandes consumidores, o preço médio de instalação pode variar de R$ 40 mil a R$ 80 mil, a depender da potência necessária para o gerador. No entanto, há ainda os custos com o material em si.
Recentemente, em 26 de abril, a Alesp manifestou concordância com a decisão do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) de isentar o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviço) para componentes e equipamentos para o aproveitamento de energia solar no Estado. A decisão inclui células voltaicas (painéis solares) e aquecedores solares de água à lista de componentes voltados para a geração de energia renovável que possuem a isenção do imposto. A medida foi publicada no Diário Oficial de 27 de abril.
Projeto similar em Pernambuco
Paralelamente, está em tramitação na Assembleia Legislativa de Pernambuco um projeto praticamente idêntico. De autoria do deputado Romero Sales Filho (União Brasil), o Projeto de Lei Ordinária 2478/2021 também prevê a implantação em estabelecimentos com mais de 1.000 m².
O texto foi distribuído para oito comissões e está parado na Comissão de Constituição, Legislação e Justiça desde 5 de agosto de 2021. Cabe a essa última avaliar a constitucionalidade do projeto, que só depois seguirá para as demais comissões da Casa.