Ao final da pesquisa desenvolvida, é possível extrair as seguintes conclusões:
- Todo e qualquer gasto público está sujeito a controle. Os benefícios fiscais equivalem a despesas públicas indiretas, estando sujeitos a controle pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário;
- Observadas as regras e princípios constitucionais (assim como os mandamentos da Lei de Responsabilidade Fiscal), os Poderes Legislativo e Executivo estão livres para fazer as escolhas que lhe pareçam as melhores, inclusive optando, se for o caso, por implementar políticas públicas através de renúncias tributárias (modalidade de intervenção no domínio econômico). Essas escolhas, desde que atendidos os requisitos constitucionais e legais, devem ficar imunes à ingerência do Judiciário;
- Executivo e Legislativo, contudo, não possuem liberdade irrestrita. Nos casos em que a utilização desse instrumento de intervenção no domínio econômico colidir com outras normas ou princípios constitucionais, será possível que o Poder Judiciário controle / compatibilize os princípios constitucionais atingidos com os benefícios fiscais concedidos, sob o prisma do princípio da proporcionalidade;
- O Poder Judiciário deve respeitar a margem de apreciação dos órgãos responsáveis pela escolha da medida, evitando se imiscuir nas esferas de decisão política e técnica dos Poderes Executivo e Legislativo. Ademais, também deve ser reconhecida aos Poderes Legislativo e Executivo uma margem de prognose quanto aos efeitos futuros das medidas adotadas. Em suma, no que tange ao mérito dos benefícios fiscais concedidos, o judiciário tem sua esfera de atuação ligada à invalidação de medidas evidentemente inadequadas, excessivas ou flagrantemente desproporcionais (stricto sensu), bem como à retirada do mundo jurídico de medidas comprovadamente ineficientes ou ineficazes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
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BARCELLOS, Ana Paula de. Constitucionalização das Políticas Públicas em Matéria de Direitos Fundamentais: O Controle Político-Social e o Controle Jurídico no Espaço Democrático. Revista de Direito do Estado, p. 17-54, jul./set. de 2006.
BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 3. ed.
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_______ Constituição, Democracia e Supremacia Judicial: Direito e Política no Brasil Contemporâneo, Revista da Faculdade de Direito da Uerj, v. 2, nº 21, jan./jun. 2012.Disponível em:http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/rfduerj/article/view/1794/2297
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MONTESQUIEU, Charles de Secondat. O Espírito das Leis. Tradução de Cristina Muracho.2. ed.São Paulo: Martins Fontes, 2000.
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VELLOSO, Andrei Pitten. O princípio da Isonomia Tributária – Da teoria da igualdade ao controle das desigualdades impositivas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010.
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[1] A expressão benefícios fiscais é utilizada no presente texto como sinônima de renúncias tributárias, ou seja, não ingresso de recursos nos cofres públicos, em virtude de benefícios e incentivos tributários. Para uma correta delimitação e distinção entre os termos benefícios e incentivos financeiros, creditícios e tributários, conferir: BOMFIM, Gilson Pacheco. Incentivos Tributários: Conceituação, Limites e Controle. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015.
[2] MONTESQUIEU, Charles de Secondat. O Espírito das Leis. Tradução de Cristina Muracho. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 165.
[3] MILESKI, Helio Saul. O controle da Gestão Pública. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p. 168.
[4] No que concerne à necessidade de concomitância de competências (tributária e legislativa), Luís Eduardo Schoueri (Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 351) afirma que “as normas tributárias indutoras sujeitam-se: I) por força do veículo pelo qual se introduzem no mundo jurídico, às regras de repartição de competências tributárias; II) por força da matéria que regulam, às regras de competência legislativa”
[5] Consoante destaca o professor Luís Roberto Barroso, tal fenômeno marca uma ruptura com os paradigmas então existentes, mormente no que concerne às funções atribuídas a cada um dos poderes, bem como a forma como se relacionam. Na realidade, essa expansão da jurisdição e do discurso jurídico acaba por transferir poder das instâncias tradicionais, como o Executivo e Legislativo, para o Judiciário, tornando ainda mais difícil a fixação de limites claros entre a atividade de criação e a aplicação do direito (BARROSO, Luís Roberto. Constituição, Democracia e Supremacia Judicial: Direito e Política no Brasil Contemporâneo, Revista da Faculdade de Direito da Uerj, v. 2, nº 21, jan./jun. 2012. Disponível em: <http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/rfduerj/article/view/1794/2297>.).
[6] Conforme lição de Luís Roberto Barroso, observadas as regras e princípios constitucionais, o Poder Legislativo e o Poder Executivo estão livres para fazer as escolhas que lhe pareçam as melhores, as quais não devem ser objeto de controle judicial, a menos que tenha ocorrido alguma ilegalidade ou inconstitucionalidade. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 444.
[7] ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 165.
[8] ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 169.
[9] Conforme precisa advertência de Humberto Ávila, a tese do não controle das escolhas efetuadas pelo Poder Legislativo e pelo Poder Executivo, sustentada de forma simples, além de atentar contra a função de guardião da Constituição atribuída ao STF, viola a plena realização do princípio democrático e dos direitos fundamentais, bem como a concretização do princípio da universalidade de jurisdição (Sistema Constitucional Tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 368).
[10] ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 162. Claudio Pereira Souza Neto e Daniel Sarmento destacam que a adequação impõe o preenchimento simultâneo de duas exigências, quais sejam: a) que o fim perseguido pela atividade estatal seja legítimo; e b) que o meio escolhido seja, ao menos, apto para o atingimento do fim buscado pela atuação estatal (Direito Constitucional: Teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 470).
[11] ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 590.
[12] ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 162.
[13] ALEXY, Robert, Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 591. Para Alexy (p. 588), adequação e necessidade determinam a máxima realização com base nas possibilidades fáticas.
[14] ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 163.
[15] VELLOSO, Andrei Pitten. O princípio da Isonomia Tributária – Da teoria da igualdade ao controle das desigualdades impositivas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 316.
[16] ALEXY, Robert, Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 593. Segundo Robert Alexy (p. 593), a tarefa de ponderação entre os princípios colidentes deve observar duas máximas: em primeiro lugar, quanto maior for o grau de não satisfação ou afetação de um dos princípios, tanto maior deverá ser a importância da satisfação do outro princípio envolvido. Em segundo lugar, quanto mais pesada for a intervenção em um direito fundamental, tanto maior deverá ser a certeza das premissas sobre as quais essa intervenção baseia-se.
[17] Mais uma vez, é precisa a lição do professor e Ministro do STF, Luís Roberto Barroso, que adverte que o reconhecimento de que juízes e tribunais podem atuar de forma criativa em determinadas situações não importa em autorização para que a vontade do judiciário sempre sobreponha a vontade do executivo e do legislativo. A preferência pela vontade manifestada pelo Poder Executivo e pelo Poder Legislativo concretiza a separação de poderes, a segurança jurídica e a isonomia (BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 444/445).
[18] SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito Constitucional: Teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 473.
[19] SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito Constitucional: Teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 476.
[20] SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito Constitucional: Teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 479.
[21] ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 366.
[22] ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 367.
[23] ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 170/171.
[24] Claudio Pereira de Souza Neto e Daniel Sarmento também defendem que o judiciário adote uma postura de autocontenção jurisdicional na avaliação de questões de caráter eminentemente técnico, assim como nas análises das prognoses legislativas. Nesses casos, o judiciário somente deve invalidar medidas que forem manifestamente inadequadas. Direito Constitucional: Teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012.
[25] ÁVILA, Teoria da Igualdade Tributária. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 171. Infelizmente, os Poderes Legislativo e Executivo não têm por hábito disponibilizar (pelo menos em seus sítios eletrônicos) os documentos e estudos utilizados para embasar suas escolhas ou opções em matéria de incentivos tributários.
[26] ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 367.
[27] MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade – Estudos de Direito Constitucional, 1998. São Paulo: Celso Bastos Editor, p. 475.
[28] Analisando a questão do déficit na fixação de prognoses legislativas pelo legislador, no âmbito da Corte Constitucional Alemã, Gilmar Ferreira Mendes revela que a citada Corte adota posição diferenciada, avaliando se a prognose se revela falha de início ou se se cuida de um erro de prognóstico somente constatável com o passar do tempo, aduzindo que somente no primeiro caso o déficit de prognose ensejaria a nulidade da lei (Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade – Estudos de Direito Constitucional, 1998. São Paulo: Celso Bastos Editor, p. 474/475). De forma contrária, Cláudio Pereira de Souza Neto e Daniel Sarmento entendem que também é possível o controle de medidas a partir de uma perspectiva ex post, que pode considerar a experiência concreta da medida analisada, bem como eventuais mudanças técnicas ocorridas desde sua implementação. Nessas hipóteses, como bem salientam os autores, não se trata de punir o órgão que realizou a escolha e formulou a política pública, mas sim de impedir que restrições a direitos fundamentais continuem surtindo efeitos, sem que se obtenha qualquer proveito com a medida adotada (Direito Constitucional: Teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 474).
[29] ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 173. O referido professor entende que igual ônus argumentativo se impõe quando o critério de diferenciação escolhido puder repercutir e diminuir a eficácia de princípios constitucionais, tais como a livre concorrência, liberdade de exercício da atividade econômica, proteção da família, etc.
[30] No mesmo sentido, embora o texto trate do controle das políticas públicas em matéria de direitos fundamentais, é o pensamento de Ana Paula de Barcellos, conforme se vê na seguinte passagem: “(…) Existindo as metas, a obrigação de prestar contas acerca de seu cumprimento, bem como das razões para o seu eventual descumprimento, não sofre, a rigor, qualquer repercussão das críticas acima. Note-se que não se estará, aqui, tomando qualquer decisão propriamente dita, de modo que não há que se discutir sobre a ampliação do espaço da Constituição – em detrimento do espaço da deliberação democrática – ou da legitimidade do judiciário para interferir em políticas públicas. Também não são relevantes as dificuldades operacionais a que se fez referência acima” (Constitucionalização das Políticas Públicas em Matéria de Direitos Fundamentais: O Controle Político-Social e o Controle Jurídico no Espaço Democrático. Revista de Direito do Estado, p. 17-54, jul./set. de 2006, p. 48).
[31] BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 443.
[32] Evidentemente, a avaliação da validade da norma não pode tornar-se uma forma velada de o magistrado substituir as escolhas políticas do legislativo por suas próprias escolhas. A declaração de inconstitucionalidade deve ser sempre a última das opções, preservando-se o ato que é passível de compatibilização com a ordem jurídica constitucional, mesmo quando, aos olhos do juiz, o tratamento do caso merecesse outra solução do ponto de vista político. Trata-se da conjugação do princípio da presunção de constitucionalidade das leis e da separação de poderes (Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 445).