Líder nas pesquisas eleitorais para o Governo de São Paulo, o petista Fernando Haddad trabalha para furar a bolha progressista e conquistar especialmente o eleitorado mais conservador das cidades do interior. “Não é um obstáculo insuperável”, avalia o professor universitário, que já foi ministro da Educação e prefeito de São Paulo.
Se um dia já foi apelidado dentro do próprio partido como “o mais tucano entre os petistas” pelo seu perfil intelectualizado, hoje Haddad conta justamente com o apoio do ex-governador e ex-tucano Geraldo Alckmin (PSB), em quem vem colando sua imagem para tentar atrair conservadores mais moderados que rechaçam Bolsonaro ou eleitores que não vêem o governador Rodrigo Garcia como um político nato do PSDB, que comanda o estado há 28 anos.
Esta é a quarta vez que Haddad disputará uma eleição. Depois de ser eleito prefeito de São Paulo em 2012, o petista não conseguiu se reeleger e perdeu para João Doria (PSDB). Também não teve êxito em derrotar Bolsonaro na disputa ao Planalto em 2018, quando substituiu o ex-presidente Lula, na época inelegível, já na metade da campanha.
Mesmo assim, Haddad manteve o recall da disputa e consolidou-se como uma importante liderança nacional, além de nome de confiança de Lula. Foi o ex-presidente, aliás, o responsável pelas suas candidaturas. Meses antes das eleições de 2012, num restaurante às margens do Lago Paranoá, em Brasília, políticos do PT ligados a Lula perguntaram a Haddad se ele toparia disputar o maior colégio eleitoral do país. “O chefe mandou construir a sua candidatura”, ouviu, pouco antes de dar sua resposta positiva.
Haddad começaria ali a construir-se como liderança — e não havia sido escolhido por acaso, como ele mesmo gosta de frisar. Já vinha chamando a atenção da maior liderança do partido enquanto os políticos mais tradicionais tinham sua imagem desgastada desde o escândalo do Mensalão. Lula acreditava que o professor universitário reunia três características importantes para amortecer o antipetismo paulistano e conquistar a classe média: “é bonitinho, são paulino e uspiano”.
Contribuição na educação
Mas não só isso. Haddad havia ficado seis anos no comando do Ministério da Educação, quando se aproximou dos ex-presidentes Lula e Dilma. Obcecado por pontualidade, prazos e metas, começou a destacar-se na gestão cedo. É o responsável por promover programas importantes para a educação brasileira, como o Prouni, que concede bolsas de estudo em universidades privadas para estudantes de baixa renda. Também criou 14 novas universidades federais, além do Sisu e do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB).
Usou essas contribuições na sua primeira campanha e, com Lula em seu palanque, convenceu o eleitorado paulistano. À frente da Prefeitura de São Paulo, criou a Controladoria Geral do Município, que revelou um escândalo de corrupção conhecido como “máfia do ISS”. Nela, fiscais cobravam propina para dar descontos em certificados de obras.
Também apostou em políticas estruturais que não demandassem volumes altos de recursos. Investiu, por exemplo, na malha cicloviária e no transporte coletivo. Disse que iria zerar filas de exames médicos e creches, promessas que não conseguiu cumprir, apesar de ter ampliado as vagas em ambos os serviços.
Um nome da frente ampla
Acabou deixando o cargo desgastado, em parte pela onda anticorrupção dos protestos de 2013 que afetava diretamente o PT, partido ao qual é filiado desde os 20 anos. Mas o cenário neste ano parece bem diferente. Com 34% das intenções de voto, segundo o último Datafolha, Haddad larga bem à frente de seus concorrentes Tarcísio de Freitas e Rodrigo Garcia, empatados com 13%. O petista conseguiu reunir seis partidos em torno de uma frente ampla, contando com apoio de nomes como Alckmin (PSB) e Boulos (PSOL).
“Estamos com a maior aliança do campo progressista da história. Vamos recuperar tudo o que foi destruído nos últimos anos. Oferecer ao país e ao Estado de São Paulo um novo rumo de desenvolvimento, sem deixar ninguém para trás”, escreveu recentemente no Twitter, num discurso que demonstra que a campanha paulista será mesmo nacionalizada.
Apesar da coligação volumosa, houve certa frustração com a recusa da ex-ministra Marina Silva para ser sua vice. Segundo interlocutores, o PT avaliava que Haddad poderia crescer 3% com o apoio da ex-ministra, que preferiu disputar vaga de deputada federal. Ao final, o petista dividirá a chapa com Lúcia França, educadora filiada ao PSB e esposa de Márcio França.
Planos para São Paulo
Haddad é o candidato ao Governo com maior número de seguidores nas redes sociais, mas perde para seu concorrente Tarcísio de Freitas, candidato de Bolsonaro, no desempenho virtual, de acordo com o Índice de Popularidade Digital (IPD), criado pela consultoria Quaest.
No instagram, conta com mais de 2 milhões de seguidores. É lá que tem buscado atrair o eleitorado mais jovem com memes como o que enumera supostas “duplas de sucesso” paulistas: “pão na chapa + cafezinho, cachorro quente + purê de batata e Lula + Haddad”.
Mas nem só de memes e de quiz se divulga uma candidatura nas redes sociais. Se vencer as eleições, Haddad pretende investir em infraestrutura e implementar uma controladoria geral para prevenir a corrupção. Na segurança, quer reformar o sistema e integrar as polícias. Também pretende criar um programa de valorização da carreira profissional e manter as câmeras de segurança em uniformes policiais.
A adoção de câmeras nas fardas da PM paulista foi responsável por uma redução de 85% na letalidade policial, no comparativo entre os últimos sete meses do ano passado e o mesmo período de 2020. Em 18 batalhões estudados, o número de mortes passou de 110 para 17.
Trajetória distante de caciques do PT
Acadêmico e autor de cinco livros, o candidato petista ao Governo de São Paulo tem uma trajetória bem diferente do sindicalista Lula. Filho e neto de libaneses, Haddad vem da classe média alta de São Paulo, onde fez bacharelado em Direito, mestrado em Economia e doutorado em Filosofia. Identifica-se como um político de centro-esquerda e historicamente esteve longe do núcleo duro de poder dentro do PT. Mas é visto por correligionários como alguém aberto ao diálogo e conciliador.
“Sou filho do casamento de um comerciante libanês com uma normalista. Aprendi em casa a negociar e conversar, e tenho um temperamento em geral tranquilo, mesmo nas situações mais adversas. As pessoas confundem isso com frieza, mas não é”, escreveu na revista Piauí. Casado com Ana Estela e pai de dois filhos, divide com a família o gosto pelo violão.
Fã de Paul McCartney, o petista costumava dar uma canjinha na guitarra em eventos quando participava de agendas como ministro e prefeito. Uma imagem cool para a juventude, mas também uma paixão que tem pelo instrumento desde pequeno. Outra paixão é a política, que ele diz fazer para ouvir as pessoas e mudar a vida delas: “Quando um Governo se preocupa com o povo, as coisas acontecem e a vida melhora.”