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coluna do graner

As nuances da discussão sobre as sanções do arcabouço fiscal

Congresso pode melhorar o desenho sem criminalizar a gestão

Fabio Graner
27/04/2023|12:00
medidas provisórias
Prédio do Congresso Nacional. Crédito: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Uma das principais discussões no Congresso sobre o novo arcabouço fiscal enviado pelo governo está nas sanções a serem impostas ao Executivo em caso de descumprimento das metas de resultado primário.

Em conversa com o JOTA pouco antes de participar de evento promovido pela Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo, o relator da matéria na Câmara, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), reconheceu que há um movimento relevante de parlamentares para que se tenha mecanismos que reforcem a necessidade de se cumprir as metas fiscais e que a proposta do Executivo, nesse sentido, tem muito pouco “enforcement”, no jargão dos economistas.

Cajado, porém, não quis se antecipar sobre o que fará no relatório. No evento, outros parlamentares aproveitaram o ensejo para apontar esse suposto problema da falta de sanções mais fortes, que estimulem o governo a buscar com mais afinco o cumprimento das metas, como os deputados Pedro Paulo (PSD-RJ) e Arnaldo Jardim (Cidadania-SP). “Tem que ter sanções e responsabilidades bem definidas”, disse Pedro Paulo. “É importante não ser punitivista, mas é preciso estímulo para cumprir”, acrescentou Jardim.

O ex-secretário do Tesouro e economista da Asa Investments, Jeferson Bitencourt também entende que a regra proposta não tem sanções adequadas para estimular o cumprimento dos alvos. Para ele, a punição que reduz o crescimento do gasto significa R$ 10 bilhões em um orçamento de R$ 2 trilhões e que é preciso ir além disso, sem precisar criminalizar a gestão fiscal.

“Acho que o Congresso pode dar uma contribuição importante para ajudar a entregar as metas fiscais”, disse, lembrando que a PEC 109, aprovada no governo passado, já trazia ideias que podem ser retomadas, como medidas que vedam contratações ou reajustes de salários de servidores ou medidas que elevem outras despesas.

O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, tem se exposto mais na defesa da proposta do governo. Segundo ele, as sanções não são tão fracas quanto se tem dito no mercado e no Congresso. Para Mello, a necessidade de o presidente enviar uma carta se explicando ao Congresso é uma punição política importante, pois não é algo comum de se ver. Além disso, o secretário também lembrou que a despesa cresce menos, caso o limite inferior da banda de tolerância da meta seja descumprida.

Ao JOTA, o secretário-executivo do Ministério do Planejamento, Gustavo Guimarães, questiona a leitura do mercado de que a regra fiscal proposta é muito frouxa por esse aspecto. Ele aponta que é preciso ter flexibilidade para gerenciar a política fiscal e que o sistema de bandas traz isso, mas ressalta que as metas são ambiciosas e criminalizar o seu descumprimento ou mesmo impor contingenciamentos em caso de não atingimento seria um estímulo para o gestor se impor objetivos mais frouxos, como já vinha ocorrendo no sistema do teto de gastos.

Ele reforça o argumento de seu colega de governo apontando que a sanção política é relevante pelo envio da carta do presidente da República. “É uma punição política”, salientou, acrescentando que, para além das duas sanções previstas, se o mercado notar que o governo não está efetivamente comprometido com a política fiscal apresentada ele punirá pela piora nos preços dos ativos. “A sanção do mercado é importante”, disse Guimarães.

A visão de que as metas são ambiciosas, e esse é quase um consenso entre críticos e favoráveis ao governo, é um ponto que deve realmente reforçar a reflexão sobre eventuais sanções e também sobre como os gestores reagiriam a isso. Será que não acabaria empurrando o governo a propor metas mais fáceis de serem cumpridas?

Vale lembrar que a equipe econômica tem sido criticada pelas vozes à esquerda, que apontam que o arcabouço restringiria mais do que deveria a gestão fiscal e o atendimento das demandas sociais e por mais investimentos para estimular a economia.

Para o economista André Paiva Ramos, diretor do Sindecon-SP, a descriminalização da política fiscal é um aspecto muito importante do novo arcabouço e que deve ser mantido. Ele participou de evento sobre as novas regras promovido na última terça-feira (25) pelo Cofecon (Conselho Federal de Economia), colegiado que tem mantido uma postura de defesa de políticas mais desenvolvimentistas.

Após o evento, foi divulgada uma carta do Conselho sobre o seminário, na qual se apontou que a proposta do governo, "além de pró-cíclica, é dependente de um crescimento significativo das receitas para garantir recursos necessários para o fortalecimento das políticas públicas". "Diante de um ritmo de crescimento econômico ainda fraco e instável, há a preocupação de como viabilizar um aumento de arrecadação fiscal compatível com as metas estabelecidas pelo NAF, visto que revisões de desonerações e de distorções tributárias podem ser insuficientes e possuem dificuldades políticas e jurídicas para se concretiza”, completa o texto.

Ao JOTA, Ramos defendeu ampliar as bandas para as metas de primário anunciadas pelo governo e maior espaço para atuação anticíclica. “Além disso, com igual relevância, também destaco que é necessário que ocorra o restabelecimento de uma tendência de crescimento real anual dos investimentos públicos, ampliando sua participação no PIB ao longo dos próximos anos", defendeu.

Entre visões de que o arcabouço fiscal é frouxo por não ter punições mais fortes e excessivamente austero por suas metas ambiciosas para gastos e primário, vai ser difícil encontrar um consenso. De qualquer forma, o Congresso pode melhorar o desenho sem criminalizar a gestão, mas apontando, com clareza maior, caminhos e incentivos melhores para que se ajuste a execução fiscal às metas propostas.logo-jota

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