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Turismo do Rio de Janeiro cresce, mas é ameaçado por insegurança jurídica

Bloqueio pela Justiça de construção de tirolesa no Pão de Açúcar pode afastar investimentos privados no setor

Foto: Unsplash

O turismo na cidade do Rio de Janeiro vem crescendo em ritmo acelerado após
a pandemia, segundo dados da Secretaria Municipal do Turismo. Já foram R$
124 milhões gerados desde o início deste ano – 70% do faturamento de 2022,
quando a cidade movimentou R$ 176 milhões de reais com visitas e estadias
em hotéis, e um aumento de 19% frente a 2019, último ano antes da covid-19
invadir o mundo.

De acordo com o Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC), a cidade
maravilhosa também figura entre as cinco que mais tiveram crescimento no
Produto Interno Bruto com o Turismo em 2022, sendo a maior na América
Latina.

Com isso, o governo do estado prometeu, no final do ano passado, investir
anualmente cerca de R$ 100 milhões de reais no setor com o objetivo de
aumentar em até cinco vezes o número de visitantes na cidade até 2032.

No entanto, investimentos privados parecem estar sofrendo para participar dos
planos de expansão turística. Em relação a esse ponto, desperta preocupação que ganhe força um cenário de insegurança jurídica em um setor crucial para a economia – não só do estado, mas do país.

O episódio mais recente trata da implementação da tirolesa no Pão de
Açúcar, que está paralisada desde junho, depois que o Ministério Público Federal (MPF) pediu na Justiça não só o encerramento das obras como também uma  multa de mais de R$ 50 milhões para a empresa Companhia Caminho Aéreo Pão de Açúcar (CCPA).

+ Leia também: Justiça ignora órgão fiscalizador e paralisa obras de tirolesa no Pão de Açúcar

Para o MPF, a CCPA – que administra o bondinho presente no complexo de morros há mais de 100 anos – cometeu danos às rochas do Pão de Açúcar, patrimônio tombado desde 1973, sem autorização prévia.

Porém, a empresa obteve permissão para alteração no local não só do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), autarquia responsável pela gerência e manutenção dos patrimônios protegidos do país, como também de outras quatro entidades.

O projeto, iniciado em dezembro de 2020 pela CCPA, colocaria quatro cabos
de 770 metros em paralelo aos dos bondinhos, já existentes no local. Para
obter autorização para o procedimento, a empresa consultou a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação (SMDEIS), a Secretaria Municipal de Ambiente e Clima (SMAC), o Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (Irph) e o Instituto de Geotécnica do Município do Rio de Janeiro (GEO-Rio).

Como averiguou o professor titular da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Gustavo Binenbojm, em parecer jurídico, o Iphan e o GEO-Rio fizeram visitas regulares às instalações desde o início de 2023.

No entanto, para o MPF, nada disso seria suficiente. A acusação do órgão é de obras sem aprovação prévia de setembro de 2022 a fevereiro de 2023: cortes nas rochas do Complexo Pão de Açúcar de caráter irreversível.

Desde a paralisação, em junho, foram encomendados novos estudos técnicos e pareceres jurídicos. No mais recente, o GEO-Rio, mais uma vez, afirmou que as intervenções não representam risco geológico para a estrutura.

Violação à segurança jurídica

Binenbojm acredita que as ações do poder jurídico ao acatar os pedidos do MPF representam grave violação a um dos um dos princípios mais importantes da Constituição Federal: a segurança jurídica.

Um dos pilares do direito brasileiro, a segurança jurídica garante a previsibilidade das leis perante todos os cidadãos igualmente. O conceito, segundo juristas, está presente implicitamente em diversas partes do texto constitucional: já na abertura, no artigo 1º, quando garante a dignidade do indivíduo, passando pelo artigo 5º, quando declara a igualdade de todos perante a Constituição.

Mais especificamente, a confiança legítima, conduta derivada do princípio de segurança jurídica, é explicitada em trechos como o da Lei 13.655/2018, que introduz as Normas do Direito Brasileiro, quando diz que “as autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas, inclusive por meio de regulamentos, súmulas administrativas e respostas a consultas”.

Segundo explica Binenbojm, a confiança legítima trata-se da capacidade do cidadão de não só esperar uma boa conduta dos órgãos governamentais como confiar plenamente de que é essa a única conduta esperada deles.

Contradições na lei, portanto, devem ser altamente evitadas. Não só porque
são inconstitucionais mas porque minam a confiança de quem lhes dá poder – o povo.

Ameaça ao Iphan

Ao ignorar as análises e autorizações feitas pelo Iphan, o MPF desqualifica a capacidade do órgão responsável pelos patrimônios tombados do país de tomar as decisões certas em sua jurisdição.

“O Iphan é uma autarquia federal que responde pela preservação do patrimônio cultural brasileiro segundo o artigo 46 da Lei 378/1937”, relembra Binenbojm. “É, portanto, a entidade com capacidade institucional para autorizar a implantação da tirolesa”.

Situação parecida ocorreu em 2015, quando as obras de revitalização da Marina da Glória foram suspensas pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região mesmo com a aprovação do Iphan.

Na época, o Judiciário acreditou que a derrubada de árvores na região poderia acarretar em danos de difícil reparação na área.  Pouco depois, no entanto, o desembargador Marcelo Pereira da Silva voltou atrás na decisão ao descobrir que a Federação de Associações de Moradores do Município do Rio de Janeiro (FAM-Rio) havia apresentado recurso fora do prazo de protocolo. No final, as obras puderam prosseguir, mas apenas após uma série de atrasos e idas e vindas.

Impactos para o Rio de Janeiro

Situações como essa colocam em risco a credibilidade jurídica do estado para iniciativas privadas no setor de turismo no Rio de Janeiro – que carece de investimentos privados para tirar melhorias do papel. O estado sofre com rombos no orçamento.

O mais recente foi no Departamento de Estradas de Rodagem (DER), que entrou na mira do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro. De acordo com o órgão, não há verba destinada ao pagamento das contratações de 2023, de quase R$ 270 milhões, e nem para as contratações remanescentes de 2022, avaliadas em quase R$ 1,3 bilhão. Tudo isso pode acarretar em suspensão de importantes obras públicas para as estradas do estado.

Para o próximo exercício financeiro, o déficit estimado para as contas estaduais é de R$ 3,6 bilhões de reais, segundo destaca o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) enviado pelo executivo estadual à Alerj (Assembleia Legislativa do Rio) em maio. O orçamento estipula uma receita líquida para o próximo ano de R$ 96,4 bilhões frente a uma despesa na casa dos R$ 100 bilhões.

Enquanto isso, uma pesquisa Datafolha realizada em agosto mostrou que quase 90% dos habitantes da cidade do Rio de Janeiro tinham esperanças de que a tirolesa do Pão de Açúcar atraísse mais turismo para o lugar – e, consequentemente, mais renda que reverberaria por toda a cidade.

A mesma pesquisa da Secretaria Municipal do Turismo que mostrou aumento no turismo na capital carioca, indicou que o Corcovado e outros complexos vêm ficando para trás no número de visitas em relação a lugares com mais infraestrutura, como o Centro Cultural Banco do Brasil, no centro da cidade.

O professor Binenbojm conclui que nenhuma empresa ou indivíduo pode “ser
surpreendido por um comportamento contraditório advindo da própria administração” como é o caso da tirolesa do Pão de Açúcar. Quanto mais
incerto é o caminho jurídico, menos investimentos o lugar pode atrair.