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Combustível do Futuro: mistura de diesel verde por produtores reduziria custos

Em debate no Senado, PL tem pontos-chave ainda indefinidos, como a responsabilidade pela adição obrigatória do biocombustível no diesel

Foto: Unsplash

Desde março, o Senado Federal discute o Projeto de Lei do Combustível do Futuro (PL 528/2020). Entre outros pontos que visam acelerar a transição energética no Brasil e cortar emissões, há a proposta de aumentar o percentual de acréscimo obrigatório de biocombustíveis ao produto fóssil ao longo dos próximos anos – esse é o caso do diesel, que poderia receber o diesel verde a partir de 2027. 

No entanto, o texto aprovado pela Câmara, agora em análise pelo Senado, não determina em qual etapa deve ser realizada a mistura do biocombustível – apenas que, entre 2027 e 2037, o percentual deve ficar entre 1% e 3% do volume do diesel fóssil. 

Nesse cenário de indefinição, eventualmente essa responsabilidade poderia recair nas distribuidoras de combustíveis – o que, em última análise, poderia gerar consequências para toda a cadeia, dificultar a fiscalização e impactar os preços ao consumidor final. 

Isso porque a etapa de distribuição é muito mais pulverizada do que a de produção de combustíveis no país. “No Brasil, existem quase 150 distribuidoras, enquanto temos poucas produtoras de combustível. Se a responsabilidade da mistura está nas empresas que distribuem, há uma maior dificuldade principalmente na fiscalização desse processo”, analisa o economista Helio Beltrão, presidente do Instituto Mises Brasil.

Atualmente, são 19 empresas com autorização para o refino no país e existem 14 portos brasileiros que realizam a importação do diesel. Enquanto isso, as mais de cem distribuidoras têm ainda aproximadamente 280 bases, o que exigiria maior esforço de fiscalização. 

Com a mistura acontecendo logo no produtor, se espera que o impacto na cadeia seja mitigado. “Por outro lado, ao se responsabilizar o distribuidor, pode ser que também haja um repasse de valores para o posto de combustível e para a revenda, repercutindo no preço pago pelo consumidor final”, acrescenta o economista.  

Um dos motivos para esse potencial aumento de preços é que, enquanto as distribuidoras estão espalhadas pelo país, os projetos de produção de diesel verde estão localizados próximos à costa e em menor número do que as refinarias de combustíveis fósseis. Assim, se o teor obrigatório acontecer nas distribuidoras, o acesso é dificultado, o que impacta os custos.  

O modelo dos Estados Unidos serve como referência para fixar a mistura durante a produção. O país foi pioneiro no mandato voltado ao diesel, com impacto em escala global por meio do Renewable Fuel Standard Program, lançado em 2005.

E, de acordo com dados da Agência Americana de Proteção Ambiental (Environmental Protection Agency), o modelo de inclusão junto aos produtores traz benefícios como o ganho de escala, diminuição de gastos com fiscalização e redução de custos logísticos. 

“Há um aumento da segurança jurídica, com diminuição das fraudes relacionadas ao descumprimento dos requisitos necessários para a venda de combustíveis no Brasil, algo que ocorre com frequência hoje em dia”, explica Rodrigo Marinho, diretor executivo do Instituto Livre Mercado.

Porém, conforme o texto atual, a definição da etapa de mistura só aconteceria posteriormente, em regulamentação pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). 

O potencial do diesel verde

A etapa de mistura é um ponto ainda em disputa em uma discussão que tem um consenso: ampliar o uso do HVO (Hydrotreated Vegetal Oil, em inglês) ou óleo vegetal hidrotratado, é uma alternativa promissora para descarbonizar a matriz energética nacional, especialmente associada ao transporte. 

Embora o HVO geralmente tenha como matéria-prima o óleo vegetal (óleo de soja, girassol, canola, entre outros), ele também pode partir de gordura animal e óleo de cozinha utilizado. O diferencial dele é que sua estrutura molecular é semelhante a do diesel fóssil. Por isso, diferentemente do biodiesel, ele tem um característica drop-in – isto é, pode substituir completamente o produto fóssil, sem necessidade de adaptações em motores ou na infraestrutura de distribuição.

O projeto no Senado estabelece que o mandato para o diesel verde variaria entre 1% a 3% no diesel fóssil anualmente até 2037. Isso se somaria ao já estabelecido mandato de biodiesel – atualmente, o acréscimo está em 14%, volume estabelecido em março. Também foi aprovada a adição anual de um ponto percentual de biodiesel ao diesel até atingir um total de 20% até 2030. 

Com isso, há a expectativa de promover uma transição energética saudável no país, que, em alguns setores, mantém uma alta dependência de combustíveis fósseis. Em relação ao diesel, estima-se que mais de 70% desse combustível seja utilizado principalmente para o transporte. 

“O diesel é um dos principais componentes da matriz energética brasileira e das atividades desempenhadas no país. Ele entra nos custos de produção de tudo que tem no Brasil. Para implementar um mandato, é preciso analisar como pode impactar em todos os nossos processos produtivos”, explica Helio Beltrão. 

Com intuito de potencializar a descarbonização no setor de mobilidade, de alta demanda energética no Brasil, o HVO é um forte candidato por aliar tecnologia à eficiência. Contudo, essa alternativa é reconhecida como ainda cara, tanto pelo custo de produção quanto de fiscalização. 

Segundo Rodrigo Marinho, do Instituto Livre Mercado, pela similaridade das moléculas do HVO e do diesel comum, é necessário usar o carbono-14 para a identificação ou das substâncias. 

“A análise da mistura de diesel com diesel verde deve ser levada para laboratório, de forma a identificar se houve alteração da porcentagem volumétrica misturada. Para isso, é usado o carbono-14, um método que é caro e também não atende a fiscalização”, aponta. 

Isso pode impor uma dificuldade de fiscalização que também preocupa. “A fiscalização de combustíveis no país já é deficiente e, quando ela existe, se concentra nas grandes empresas. Esse problema é diminuído quando se concentra etapas primordiais em grandes empresas, que não querem que sua reputação seja impactada”, observa o economista Helio Beltrão. Por isso, o caminho com foco da mistura na produção.

O PL no Senado Federal

O projeto de lei teve o texto aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 13 de março deste ano. Após ser aprovado, o PL foi apresentado à Comissão de Serviços de Infraestrutura do Senado, tendo como relator o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB). 

Nesta última terça-feira (4/6), a Frente Parlamentar de Recursos Naturais do Senado recebeu o relator do projeto na Câmara, o deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), o presidente da Frente Parlamentar do Biodiesel, Alceu Moreira (MDB-RS), e outros políticos e executivos envolvidos no projeto, com intuito de estabelecer acordos para essa nova política. 

O senador sinalizou que pretende apresentar o relatório na próxima semana. Se houver alterações na proposta, o texto deve retornar à Câmara. 

De acordo com o texto aprovado na Câmara, até 2037, será estabelecido pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) o mínimo obrigatório de diesel verde incluído à variante comercializada.

Estará permitido um acréscimo superior a esse limite, mediante comunicação à ANP, que deve definir o percentual de mistura obrigatória. A adição voluntária poderá ser solicitada para setores estabelecidos, como transporte público, transporte ferroviário, tratores e maquinários utilizados na agricultura, dentre outros. 

Segundo o PL, a oferta desse biocombustível deve seguir de acordo com a disponibilidade da matéria-prima, além da capacidade e localização dessa produção. O impacto tanto no preço ao consumidor final quanto em relação à competitividade nos mercados internacionais sobre o diesel produzido internamente também deve ser considerado.