Depois de perder a batalha pela recriação do Ministério do Planejamento, pleito liderado pelos senadores do centrão, a base governista de Jair Bolsonaro conseguiu emplacar uma reformulação importante na execução orçamentária no ano eleitoral, acolhendo demandas do Congresso e fragilizando a posição do ministro Paulo Guedes.
O decreto baixado pelo Planalto que delega à Casa Civil a prerrogativa de validar a transferência dos recursos públicos para as pastas em 2022 é interpretado por aliados do governo no Legislativo e economistas como uma intervenção informal nos poderes da equipe econômica –embora do ponto de vista prático, tenha efeito limitado.
Trata-se, na avaliação do QG bolsonarista, de uma espécie de “seguro” contra cortes em ministérios hoje comandados por políticos. Prestes a promover uma reforma ministerial e com vários partidos cobiçando as pastas, é essencial garantir a esses atores da coalizão governista que haverá recursos para executar o orçamento na ponta. Os agentes públicos, dizem essas fontes, se sustentam nas suas bases levando os recursos prometidos.
“Teremos agora um orçamento eleitoral. Com todos os bônus e o ônus que isso significa”, resumiu ao JOTA um dos parlamentares mais experientes da base de sustentação ao governo Bolsonaro.
O clima no Congresso é de comemoração. Dirigentes das principais siglas aliadas celebram o “empoderamento” de Ciro, que, na avaliação desse grupo, vai conseguir centralizar e monitorar melhor as demandas. “O impacto foi positivo. Os deputados da base estão se sentindo acolhidos”, afirmou um congressista ouvido pelo JOTA.
Em outra frente, a modificação foi lida com um revés da ministra Flávia Arruda, titular da Secretaria de Governo, bombardeada pelos parlamentares do centrão recentemente sob a acusação de negligenciar as solicitações desse bloco ao Executivo.
Do ponto de vista técnico, especialistas em orçamento entendem a manobra como uma alternativa política à recriação da pasta do Planejamento.
“Primeiro, revela insatisfação em relação a esse modelo em que a economia abarca planejamento, orçamento e financeiro. Segundo, mostra que o presidente quer ter controle sobre o que sai da economia. Terceiro, fica evidente uma politização maior do orçamento”, concluiu um técnico do Congresso com trânsito na Esplanada ouvido pelo JOTA.
O fato inconteste é que Ciro, pragmático e ex-lulista, além de exímio operador no Nordeste, fica mais amarrado ao projeto de reeleição de Bolsonaro com os ‘superpoderes’ que passa a ter no papel. Congressistas avaliam que o chefe da Casa Civil passará a exercer, a partir de agora, uma função transversal na cozinha do Planalto, tomando à frente da agenda “realizadora” do Executivo.
Agora, o líder do centrão fica com tudo, amealha um poder considerável olhando o funcionamento das engrenagens de Brasília. Assim, Bolsonaro consegue reduzir significativamente o risco de deserção em curto prazo –o que seria fatal para seu projeto político para a corrida presidencial.
Veja bem
No ‘front’ do Ministério da Economia, Guedes tem tentado minimizar o significado do decreto baixado por Bolsonaro, com as digitais da Secretaria Geral da Presidência, ocupada por seu desafeto Luiz Eduardo Ramos.
Para ele, trata-se da operacionalização de um sistema que já existe na prática. O ministro fez questão de reforçar, reservadamente, que as decisões orçamentárias seguem sob seu comando e da junta que envolve diversas pastas, na qual ele considera contar com a maioria dos assentos.
Também nos bastidores, Guedes tem dito que a medida até alivia as pressões políticas sobre sua mesa, já que agora a Casa Civil será formalmente uma “validadora” das decisões de seu ministério. “Acaba com essa história de sabotagem da equipe econômica”, resume uma alta fonte da pasta.