Direitos humanos

Corte Interamericana arquiva caso Ximenes Lopes x Brasil

Juízes consideraram que o país cumpriu todas as medidas de reparação ordenadas na sentença, de setembro de 2006

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Crédito: Arquivo pessoal

A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) arquivou o caso Ximenes Lopes x Brasil ao considerar que o país cumpriu as medidas de reparação ordenadas na sentença, de setembro de 2006. A decisão pelo arquivamento foi tomada na última segunda-feira (25/9).

Este foi o primeiro caso brasileiro julgado pelo tribunal e acabou com a condenação do Estado por violação dos direitos à vida e à integridade pessoal em detrimento de Damião Ximenes Lopes, bem como pela violação dos direitos à integridade pessoal, às garantias judiciais e à proteção judicial em detrimento da mãe, do pai e os irmãos dele.

Ximenes Lopes, portador de deficiência intelectual, foi morto dentro de uma clínica psiquiátrica ligada ao Sistema Único de Saúde em Sobral (CE), em outubro de 1999, três dias depois de ser internado após uma crise.

Embora o corpo da vítima tivesse sinais de violência, a causa da morte foi registrada como “natural” e posteriormente como “causa indeterminada”.

A família de Ximenes Lopes tentou comprovar na Justiça brasileira que ele foi vítima de tortura e que profissionais da saúde da clínica foram omissos. Contudo, nenhum processo prosperou.

Diante da ausência de respostas efetivas no Brasil, a irmã da vítima, Irene Lopes denunciou o caso à Organização dos Estados Americanos (OEA). A organização de direitos humanos Justiça Global ingressou como co-peticionária no caso em 2003.

De acordo com Isabel Lima, psicóloga e coordenadora de Desenvolvimento Institucional da Justiça Global, o caso impulsionou o avanço da reforma psiquiátrica no país e das políticas públicas de cuidado em saúde mental em liberdade.

“O que foi feito com Damião Ximenes deixou evidente que espaços de privação de liberdade, como hospitais psiquiátricos, baseados no modelo asilar e na lógica da exclusão, são incompatíveis com os direitos humanos e são essencialmente violadores”, afirma a psicóloga.

A sentença

Na sentença, emitida em julho de 2006, a Corte declarou que o Estado “falhou em seus deveres de respeito, prevenção e proteção, em relação à morte e aos tratamentos cruéis, desumanos e degradantes sofridos pelo senhor Damião Ximenes Lopes” quando foi internado na referida instituição. Além disso, concluiu que o Estado não cumpriu “o seu dever de regular e fiscalizar os cuidados médicos de saúde, que constituem deveres derivados especiais da obrigação de garantir os direitos à vida e à integridade pessoal.

A Corte também determinou que, na investigação da morte e dos maus-tratos sofridos pelo senhor Ximenes Lopes, foram violados os direitos às garantias judiciais e à proteção judicial de seus familiares, uma vez que o Estado não atuou com a devida diligência necessária para este tipo de caso e a investigação não foi realizada num prazo razoável.

Em virtude das violações mencionadas, a Corte ordenou as seguintes medidas de reparação:

  • Garantir, em prazo razoável, que o processo interno destinado a investigar e punir os responsáveis ​​pelos fatos deste caso produza os devidos efeitos
  • Fazer as publicações da sentença;
  • Continuar a desenvolver um programa de formação e formação para pessoal médico, psiquiátrico, psicológico, de enfermagem, auxiliares de enfermagem e para todas as pessoas ligadas aos cuidados de saúde mental, em particular, sobre os princípios que devem reger o tratamento das pessoas com deficiência intelectuais, de acordo com as normas internacionais sobre a matéria e as estabelecidas na sentença;
  • Pagar indenização às vítimas por danos materiais e imateriais,
  • Pagar a Albertina Viana Lopes, mãe de Damião Ximenes Lopes, valores relativos a reembolso de custas e despesas.

Em abril deste ano, o Estado realizou a primeira edição do curso “Direitos Humanos e saúde mental – curso permanente Damião Ximenes Lopes”, o que, para os juízes da Corte, serviu como cumprimento da medida relativa à capacitação dos profissionais vinculados aos cuidados das pessoas com deficiência intelectual sobre direitos e princípios — a única que não havia sido cumprida.

Com o arquivamento, o caso foi considerado concluído. Assinaram a resolução os juízes Ricardo C. Pérez Manrique (presidente, Uruguai), Eduardo Ferrer Mac-Gregor Poisot (México), Humberto Antonio Sierra Porto (Colombia), Nancy Hernández López (Costa Rica) e Patricia Pérez Goldberg (Chile). O juiz Rodrigo Mudrovitsch não fez parte da deliberação porque o regulamento da Corte não permite que juízes participem de julgamentos sobre o país de origem. A juíza Verónica Gómez (Argentina) também não participou por motivo de força maior.