O julgamento sobre a validade das taxas estaduais para o serviço de mineração deve abrir os trabalhos do Supremo Tribunal Federal (STF) no segundo semestre de 2022 e está entre um dos processos de maior interesse da indústria brasileira. Embora a discussão esteja focada, a princípio, em três estados — Minas Gerais, Amapá e Pará —, a decisão dos ministros servirá de precedente para evitar a proliferação de taxas do gênero em estados e municípios brasileiros. A discussão ocorre nas ADIs 4785, 4786 e 4787.
“O que a gente percebeu é que não só há esse movimento [de criação de taxas] em outros estados como há movimentos em municípios. Municípios localizados em espaços físicos onde há mineração já estão trabalhando em suas taxas”, explica Cássio Borges, diretor jurídico da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
“Então essas taxas passaram a ser vistas como uma arrecadação extra e esses entes públicos pouco importam com a natureza jurídica da taxa — que a taxa não é um imposto, a taxa tem que ter correspondência com a atividade estatal… — nada disso está sendo refletido pelas municipalidades e estados. Por isso é importante que o Supremo confirme os precedentes das ADIs 5489 e 5374”, acrescenta Borges. Nessas duas ações o STF declarou inconstitucionais duas leis estaduais que instituíram taxas de fiscalização de energia e de água no Rio de Janeiro e no Pará, o que foi considerado uma vitória para a indústria.
O diretor jurídico da CNI lembra que o Supremo tem entendido pela constitucionalidade das taxas, mas nos casos analisados, a Corte vê desproporção entre a quantia cobrada e a atividade exercida pelo estado e, por isso, afasta a cobrança.
Essas ações tributárias estão na Agenda Jurídica da Indústria Brasileira divulgada nesta semana pela CNI. Há uma redução do número de processos de interesse da indústria: em 2021, eram 91; em 2022, caiu para 68 processos.
A publicação mostra também que o tempo de tramitação médio de ações de interesse da indústria é de sete anos no caso das ações de controle concentrado (ADI, ADPF, ADO e ADC). Entram nesses cálculos os processos em que a CNI atua como parte, terceira interessada ou observadora. Na agenda de 2021, esse tempo foi de cinco anos e dez meses e na agenda de 2020, sete anos e dois meses. Assim, houve um aumento no tempo médio das taxas na comparação entre 2020 e 2021 de mais de um ano. A CNI pondera que o ideal seria o prazo máximo de três anos para a análise completa de um processo.
Uma explicação para o tempo médio de sete anos e a redução no número de processos de interesse é o uso mais corriqueiro do plenário virtual no STF. A possibilidade de votação virtual começou em 2007 apenas para votação de casos em repercussão geral. A partir de 2016, o Supremo expandiu as possibilidades de casos a serem julgados em ambiente virtual. Desde 18 de março de 2020, o plenário virtual do STF passou a ter competência para julgar qualquer classe processual.
A CNI vê como positivo o ambiente virtual de deliberação porque ajuda a diminuir a insegurança jurídica. “A indefinição do que verdadeiramente vai valer é o pior dos mundos para o empresário”, analisa Cássio Borges, diretor jurídico da CNI. Porém, a instituição pondera que o plenário virtual precisa de aprimoramentos, como por exemplo: os critérios que justificam a inclusão de determinados processo no plenário virtual em detrimento de outros; a ausência das deliberações dos ministros em tempo real; e a impossibilidade de ajustes pontuais nas sustentações orais, a partir do relatório e das intervenções dos demais advogados para resolver questões de ordem ou de fato.
Principais matérias de interesse
As matérias tributárias e trabalhistas correspondem a 68% de todas as ações de interesse da indústria. Temas administrativos e regulatórios somam 21%; temas ambientais, 10% e 1% de processo civil.
Outra ação tributária de destaque para a CNI é a ADI 7153, que questiona os decretos do presidente Jair Bolsonaro (PL) que alteraram as alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Há uma liminar do relator, Alexandre de Moraes, suspendendo a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para mercadorias que concorrem com itens produzidos na Zona Franca de Manaus, ou seja, são manufaturadas em outros polos industriais fora da região Amazônica.
Já em matéria trabalhista, um dos destaques é a ADC 80, em que a Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif) defende que o benefício da justiça gratuita, na Justiça do Trabalho, somente seja concedido quando for efetivamente comprovada a insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo. O relator da ação é o ministro Edson Fachin. Segundo a entidade, há controvérsia na Justiça do Trabalho em relação aos requisitos indispensáveis à concessão da assistência judiciária gratuita, conforme o estabelecido na reforma trabalhista.
Em matéria ambiental, os embargos de declaração nas ADIs 4901, 4902 e 4903, que tratam sobre dispositivos do Código Florestal, também são acompanhados pela indústria. As ações discutem restrições quanto ao uso das propriedades rurais (áreas de reserva legal e de preservação permanente e regras de regularização e adequação de atividades consolidadas nessas áreas). A maioria dos dispositivos questionados foram declarados constitucionais pelo STF.
Vitórias e perdas para a indústria
Outra informação trazida no documento é que o Supremo julgou favoravelmente ao posicionamento defendido pela indústria brasileira em 15 das 30 ações julgadas em 2021. Outras 10 foram extintas sem julgamento de mérito e, portanto, não é possível qualificar se o resultado foi positivo ou negativo à indústria.
Entre as vitórias no Supremo de assuntos de interesse da indústria estão a decisão de que os acordos e convenções coletivas trabalhistas se sobrepõem à legislação existente, desde que o negociado não afaste direitos trabalhistas previstos na Constituição, como salário, seguro-desemprego, licença-maternidade e FGTS (ARE 1121633). Ao mesmo tempo, a indústria também teve derrotas, como na ação em que o Supremo manteve a validade da Lei estadual 14.274/2010, de São Paulo, que obriga a indústria a comunicar no rótulo a existência de organismo geneticamente modificado quando esta for igual ou superior a 1%. A legislação federal vigente sobre o tema impõe a mesma obrigação para produtos com índice de transgenia acima de 1%.