O esforço legislativo na última semana para a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que turbina uma série de benefícios sociais – conhecida como PEC Kamikaze – fez com que a votação do Projeto de Lei das Debêntures de Infraestrutura (PL 2646/2020) fosse deixada de lado neste momento.
Apesar de o PL constar entre as prioridades do governo federal para este ano, a base do presidente Jair Bolsonaro (PL) preferiu destacar medidas que podem trazer retornos eleitorais de curto prazo por conta das eleições de outubro. Segundo o JOTA apurou, haverá uma tentativa de pautar o projeto depois do recesso. No entanto, entidades representativas do setor de infraestrutura, que participaram da articulação do projeto, não estão mais tão esperançosas.
O PL está parado no Senado desde o ano passado, quando foi aprovado na Câmara dos Deputados. A reportagem tentou falar com o relator do projeto, o senador Wellington Fagundes (PL-MT), mas sua assessoria informou que ele só se manifestará sobre o assunto depois que receber o relatório da consultoria do Senado sobre o PL – o que deve acontecer em agosto.
Acompanhado de perto pelo mercado financeiro, o PL 2646/2020 cria as debêntures de infraestrutura, que seriam emitidas por concessionárias de serviços públicos para financiar grandes projetos do setor.
Atualmente já existe a chamada debênture incentivada, que concede benefício para as pessoas físicas, ou seja, em geral pequenos investidores. No projeto que está em trâmite, os atrativos são para os fundos de investimentos institucionais, que possuem estrutura de passivos de longo prazo. A ideia seria atrair investimentos deste tipo especificamente em projetos de infraestrutura – que custam bilhões de reais.
A Associação Brasileira da Infraestrutura e das Indústrias de Base (ABDIB), uma das entidades que participou da articulação do projeto, divulgou uma nota em que manifesta “preocupação com o avanço de medidas extremamente prejudiciais à estabilidade econômica do país na agenda do Congresso Nacional e alerta para os riscos que as medidas contidas na PEC nº 15 (PEC Kamikaze) representam para a já combalida economia brasileira e sua imagem perante o mercado e investidores internacionais”.
O presidente da ABDIB, Venilton Tadini, lamenta que o Congresso tenha optado por orientar questões de curto prazo e postergar os projetos com soluções para grandes investimentos a médio e longo prazo.
“Isso é um perigo. Nós vínhamos desde 2019 em um processo muito importante de aprovação para medidas de infraestrutura, numa agenda legislativa muito positiva. É uma pena interromper esse processo esse ano, principalmente pela qualidade dos projetos já aprovados” afirma Tadini. “A necessidade de recursos é muito substantiva e, para isso, o PL das Debêntures de Infraestrutura é fundamental. Esperamos que pelo menos esse projeto ainda seja votado neste ano.”
Para Tadini, usar a grave crise social que o país enfrenta, e que foi gerada justamente pela paralisia da economia, como pretexto para a adoção de medidas eleitoreiras – que devem provocar uma paralisia ainda maior –, é preocupante.
“Isto revela uma falta de compromisso com a pauta que realmente importa para que o país supere o atraso e retome o crescimento. Mostra, além disso, a opção por soluções que podem reconduzir o país a momentos trágicos de sua história econômica que todos julgávamos superados”, afirma o presidente da ABDIB.
“As medidas anunciadas, além disso, absorverão recursos que gerariam efeitos mais consistentes se fossem destinados à saúde, à educação e às obras de infraestrutura que, além de gerar centenas de milhares de emprego, são essenciais para a ativação do sistema produtivo nacional”, conclui.