Os ministros da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) formaram placar de três a um nesta quarta-feira (6/4) a favor de um entendimento processual que poderá reabrir o prazo para que poupadores recebam a correção monetária do saldo de cadernetas de poupança atingidos pelos planos econômicos vigentes no Brasil entre o fim dos anos 1980 e o início dos anos 1990 – Planos Bresser, Verão e Collor.
Depois da formação desse placar, o julgamento foi suspenso por um pedido de vista regimental do relator, ministro Luís Felipe Salomão. A discussão é objeto do REsp 1233314/RS.
De acordo com o relator, a decisão pode causar um impacto de mais de R$ 150 bilhões para o sistema financeiro. Já a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) trabalha com um impacto de até R$ 800 bilhões.
Tecnicamente, o placar até agora é favorável para definir que a citação válida feita em ação coletiva para defesa de direitos individuais homogêneos interrompe o prazo prescricional para a propositura das ações individuais que versem sobre o mesmo tema.
No caso concreto, uma cliente da Caixa Econômica Federal ajuizou uma ação em 2009 para receber a correção monetária expurgada da sua caderneta de poupança, em razão do Plano Verão de 1989. Ao ajuizar a demanda, ela extrapolou o prazo de 20 anos para ações de cobrança de expurgos inflacionários em caderneta de poupança. Para afastar a prescrição, porém, a cliente alegou que a citação em ação coletiva no Rio Grande do Sul sobre o mesmo assunto interrompeu a prescrição.
Quando há um expurgo inflacionário, isso significa que, em um período de instabilidade, aplicações em contas bancárias foram corrigidas por um índice abaixo da inflação, com perdas para quem aplica o dinheiro.
O julgamento estava suspenso desde junho de 2021 e foi retomado nesta quarta-feira (6/4) com um voto-vista do ministro Mauro Campbell. O magistrado acompanhou a divergência aberta pelo ministro Herman Benjamin no sentido de definir que, sim, a citação válida em ação coletiva interrompe o prazo prescricional para a ação individual.
Antes da suspensão do julgamento, a ministra Nancy Andrighi também havia acompanhado a divergência. Por outro lado, o voto do relator foi contrário à interrupção da prescrição para a ação individual, por entender que tal efeito violaria os princípios da segurança jurídica e da legalidade.
Em seu voto-vista, Mauro Campbell afirmou que a jurisprudência do STJ se fixou pela interrupção do prazo prescricional da pretensão individual em face do ajuizamento de ação coletiva.
Para o magistrado, essa interpretação é uma forma de conferir segurança jurídica aos fatos sociais. O ministro afirmou que, ao não propor uma ação individual enquanto aguarda uma decisão em ação coletiva sobre o mesmo tema, a parte tem uma atitude “consentânea e compatível com o sistema do processo coletivo”.
Campbell afirmou ainda que, com o fim de evitar a judicialização de diversas demandas e garantir a saúde das instituições financeiras, pode se perder uma “pretensão legítima de quem perdeu a economia de uma vida”.
“Assim, para situações como a em debate, reconheço a necessidade de manutenção da jurisprudência da Corte. Para casos como esse, até o presente momento, o entendimento é no sentido de que há interrupção do prazo prescricional da ação individual causada pela citação em processo coletivo”, disse o ministro.
Posição da Febraban
Por meio de nota, a Febraban afirmou que o impacto financeiro de potenciais novas ações sobre o tema pode ultrapassar R$ 800 bilhões, de acordo com estudos do economista Bernard Appy. Além disso, pode haver uma queda no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de até 12,8% nos próximos 10 anos.
A federação disse ainda ainda que decisões que levem à “eternização dos conflitos nas cortes brasileiras” não contribuem para a segurança jurídica no Brasil e podem ter reflexos em todas as áreas, incluindo consumo, previdência e meio ambiente.
“No caso de planos econômicos, prevalecendo o entendimento nessa direção, poupadores que ainda não propuseram a ação de ressarcimento, poderiam fazê-lo, mesmo passados quase 40 anos da implementação dos planos. Esse cenário não condiz com a necessária previsibilidade institucional para o ambiente de negócios”, afirma a Febraban.