Guilherme Pimenta

Luis Viviani

Começou a ser desenhado um amplo plano de comunicação contra atos dos procuradores da República integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato e do juiz federal Sérgio Moro, que comanda os processos do caso na 13ª Vara Federal de Curitiba (PR).
A campanha, evidentemente, não atacará o objeto da operação – o combate à corrupção –, mas tentará mostrar situações que, na visão dos defensores de investigados e réus, constituem violações a preceitos básicos do devido processo legal.
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O objetivo é criar um ambiente favorável na opinião pública e, assim esperam os criminalistas, também no Judiciário, para facilitar a obtenção de decisões favoráveis a seus clientes. Os principais réus da operação, embora presos, têm milhões de reais a seu dispor para encomendar ações de assessoria de imprensa, relações públicas e marketing. E é essa, justamente, sua nova aposta.
Nos últimos dois anos, advogados renomados colecionam derrotas instância após instância na defesa dos clientes envolvidos – e dos acusados de envolvimento – com o maior esquema de corrupção já descoberto no Brasil.
No início do caso, criminalistas apostavam que as cortes superiores derrubariam as decisões de Moro. O que se vê hoje é que as acusações e condenações são mantidas dia-a-dia tanto no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, quanto no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal.
Em especial, a cada delação, que insere novas peças no quebra-cabeças e confirma alguma parte do intricado esquema de assalto aos cofres da Petrobras, diminui a chance de que alguma parte significativa da apuração seja anulada.
Ritmo permanente de novidades
O avanço da Lava Jato no Judiciário tem sido acompanhado de uma bem executada estratégia de divulgação de informações à imprensa por parte das autoridades envolvidas no caso. Todo dia há algo de novo para se noticiar, de modo que o assunto está sempre quente e a sociedade é sempre lembrada do quanto o patrimônio público foi lesado.
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“A publicidade conferida às investigações teve o efeito salutar de alertar os investigados em potencial sobre o aumento da massa de informações nas mãos dos magistrados, favorecendo novas confissões e colaborações. Mais importante: garantiu o apoio da opinião pública às ações judiciais, impedindo que as figuras públicas investigadas obstruíssem o trabalho dos magistrados, o que, como visto, foi de fato tentado”, escreveu o juiz Sérgio Moro em 2004, em artigo intitulado “Considerações sobre a Operação Mani Pulite”, publicado na revista CEJ, do Conselho da Justiça Federal. No texto, ele analisa os fatores que permitiram o sucesso da Operação Mãos Limpas, na Itália, e os valida do ponto de vista ético. As mesmas medidas são vistas na Lava Jato.
A batalha por corações e mentes
Na semana passada, quando surgiu o plano da campanha de comunicação, já estava em andamento a colheita de assinaturas do manifesto assinado por 105 advogados, publicado na quinta-feira (14/01).
Na carta, advogados afirmaram que a Lava Jato instituiu um “regime de supressão de direitos e garantias”, argumentando que “nunca houve um caso penal em que as violações às regras mínimas para um justo processo estejam ocorrendo em relação a um número tão grande de réus e de forma tão sistemática”.
Os procedimentos do caso foram comparados à inquisição – e até à ditadura militar. A ideia era reunir nomes de peso na advocacia criminal para dar prestígio e robustez às críticas e tentar, mais uma vez, emplacar a tese de violações de direitos.
“Já fui à imprensa várias vezes falar dos abusos cometidos nessa operação”, diz o criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, defensor de vários envolvidos na investigação. “A possibilidade de se fazer comentários, contestar atos por meio de recursos judiciais é a que utilizamos mais, mas também esse modelo, de se pronunciar publicamente é uma forma democrática e útil de se fazer ponderações”, diz Augusto de Arruda Botelho, advogado de Márcio Faria, executivo da Odebrecht.
Apesar de o manifesto dizer que seus clientes são vítimas de um “massacre midiático”, os advogados evitam criticar a imprensa.
“De certa forma, a imprensa tem tentado mostrar todos os lados. Historicamente, e isso não é uma crítica é uma contestação, as acusações rendem mais para os jornais do que absolvições. A imprensa se interessa mais pela acusação do que pelas teses da defesa e, muitas vezes, dá mais espaço e mais matérias com viés acusatório”, critica Botelho.
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A influência da opinião pública
Até agora, quase todas as decisões de Moro foram confirmadas tanto pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, quanto pelas cortes superiores, em Brasília. Os advogados atribuem as decisões a “esta estratégia de massacre midiático passou a fazer parte de um verdadeiro plano de comunicação, desenvolvido em conjunto e em paralelo às acusações formais, e que tem por espúrios objetivos incutir na coletividade a crença de que os acusados são culpados (mesmo antes deles serem julgados) e pressionar instâncias do Poder Judiciário a manter injustas e desnecessárias medidas restritivas de direitos e prisões provisórias, engrenagem fundamental do programa de coerção estatal à celebração de acordos de delação premiada.”
Além disso, segue a carta, “magistrados das altas Cortes do país estão sendo atacados ou colocados sob suspeita para não decidirem favoravelmente aos acusados em recursos e habeas corpus”.
A afirmação refere-se, segundo advogados, aos recentes episódios envolvendo o ministro Marcelo Navarro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Recém nomeado no STJ, Dantas tornou-se relator da Lava Jato na 5ª Turma da Corte e, em mais de uma ocasião, votou pela liberdade de réus da operação - sendo vencido pelos demais integrantes da Turma.
Rapidamente, surgiram rumores de que seus votos tinham conotação política e seu nome apareceu citado numa gravação que levou à prisão o senador Delcídio Amaral (PT-MS). Em seguida, Dantas anunciou seu afastamento da relatoria dos casos.
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“No STJ, o ministro tomou algumas decisões como se não pudesse, como se elas depusessem contra ele. Colocam em dúvida uma homem que tem um passado”, diz o advogado Roberto Podval, que defende o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu.
“Essa carta caiu no vazio"
Uma semana depois da divulgação do manifesto, ele não produziu efeito prático algum, avaliam representantes de delegados, procuradores e juízes. “Essa carta caiu no vazio”, diz o presidente da Associação Nacional dos Procuradores da Reública (ANPR), José Robalinho Cavalcanti. Segundo o presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Antônio Cesar Bochenek, o único efeito prático do manifesto foi permitir aos advogados “prestar contas aos seus clientes”.
Nem poderia ser diferente, segundo o presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), Carlos Eduardo Sobral:
“Todas as autoridades envolvidas no caso atuam de forma técnica, levando em consideração apenas os fatos, as provas e os argumentos produzidos nos autos. Assim, garantem que investigações e processos transcorram de forma legítima.”
“A carta foi uma tentativa legítima – pois todo direito à manifestação é positivo – de influenciar a opinião pública. Mas a sociedade tem de maneira clara o resultado de um progresso legislativo e das instituições com capacidade de fazer um bom trabalho em crimes mais complexos. Se a tentativa era de fazer algum combate mais direto, não deu certo”, analisa Robalinho.
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Uma ressalva 
A influência da opinião pública em autoridades e políticos é inegável, afirmam especialistas ouvidos pelo JOTA. “Lá no século XIX, o historiador francês Alexis de Tocqueville já disse que é a opinião pública, e não a Suprema Corte, a instância superior da sociedade”, diz Paulo Kramer, professor de Ciências Políticas na UNB. Mas não se deve apenas a isso o avanço da operação, segundo ele. “O juiz e os procuradores estão fazendo um excelente trabalho, com fundamentações à prova de bala.”
O professor de Ética e Filosofia da Unicamp Roberto Romano afirmou que é praticamente impossível a opinião pública passar a apoiar a defesa dos réus, porque a “catástrofe da Petrobrás” está comprovada. “Os próprios advogados sabem que não há espaço para reverter a operação, já que o juiz responsável tem o aval das instâncias superiores da Justiça. Isso só teria alguma chance de acontecer se houvesse uma prova muito contundente de dolo ou de severo erro processual por parte de Moro, do Ministério Público Federal ou a Polícia Federal”, pondera o professor.
Leia os destaques da entrevista com Antonio Bochenek, presidente da Ajufe:
Qual o efeito da publicação da carta dos advogados?
O efeito é reforçar a importância desta operação e das demais realizadas. Essa carta reflete o passado retrógrado daquilo que era processo penal brasileiro e evidencia ele está passando por transformações muito importantes. Temos leis e mecanismos novos, como a delação premiada, que permitem que os grandes esquemas sejam revelados.
E há alguma consequência do ponto de vista prático?
Não. Naquela carta, eles estão apenas esperneando por não ter conseguido vitórias dentro da sistemática antiga e retrógrada, com que estavam habituados. Eles se utilizaram de vias extraprocessuais para tentar desqualificar os membros das instituições responsáveis por esse trabalho, mas não funcionou. Me parece que um efeito prático que tenham alcançado foi o de prestar contas aos seus clientes.
Uma eventual campanha de comunicação pró-defesa pode ter impacto na condução da operação?
Não. Os ministros e juízes federais estão preparados para qualquer pressão. Estamos preparados, capacitados e responderemos de acordo com nossas convicções e com o modelo mais atualizado de Justiça.
A Operação Lava Jato mudou o sistema de Justiça do país?
É o início de uma transformação. Nenhuma mudança ocorre da noite para o dia. Trata-se do encadeamento de atos que vão criando uma nova cultura. A Operação Lava Jato é um caso de grande repercussão, mas sozinha não trará transformações para a sociedade. É importante que ela desencadeie outros atos, outras operações e que, no final, transformem nosso sistema penal em algo moderno, pronto para enfrentar a criminalidade mais sofisticada.
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JOTA

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