Grasielle Castro
Editora do site em São Paulo. Responsável pela cobertura de política. Foi repórter no Correio Braziliense, repórter e editora no HuffPost e coordenadora de sucursais no Metrópoles. Email: grasielle.castro@jota.info
Em depoimento, Walter Delgatti Neto disse que o ex-presidente afirmou ter 'grampos' feitos por agentes internacionais
Em depoimento à CPMI do 8 de janeiro, o hacker Walter Delgatti Neto afirmou que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) disse a ele por telefone que tinha "grampos" feitos contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. Na conversa, segundo Delgatti, conhecido como "hacker da Vaza Jato", Bolsonaro pediu para que ele assumisse a autoria desse material. Esse diálogo, ainda de acordo com o hacker, foi intermediado pela deputada Carla Zambelli (PL-SP) em 2022 antes das eleições.
"Segundo ele [Jair Bolsonaro], esse grampo já havia sido realizado, teria conversas comprometedoras do ministro e ele precisava que eu assumisse a autoria desse grampo, lembrando que eu era o hacker da Lava Jato. Então seria difícil a esquerda questionar essa autoria porque lá atrás eu havia assumido a Lava Jato, que realmente fui eu, e eles apoiaram. Então a ideia seria o garoto da esquerda assumir esse grampo", disse.
"A informação que eu tenho é que ele estava grampeado já, que já havia o grampo. Eu não sei se seria um futuro grampo, ou eles se eles estavam se garantindo já."
O hacker disse que aceitou a proposta por ter sido feita por um presidente da República. Em troca, Bolsonaro teria lhe prometido um indulto. "Ele ainda disse assim, olha, se por ventura alguém te prender, eu vou prender o juiz. Ele usou essa frase."
Delgatti afirmou também que, segundo Bolsonaro, as interceptações haviam sido realizadas por "agentes de outro país". "Não sei se é verdade, se realmente aconteceu o grampo, porque eu não tive acesso a ele", disse o hacker ao colegiado. Na conversa por telefone, o ex-presidente teria lhe contado que o material "seria suficiente para alguma ação contra o ministro e que as eleições seriam refeitas". "Ou melhor, que as eleições fossem feitas com a urna que imprimisse o voto", completou.
Aos parlamentares, Delgatti relatou como ocorreu a aproximação com a deputada Carla Zambelli, disse que não chegou a trabalhar diretamente no gabinete dela, mas que prestou serviços para ela na gestão de suas redes sociais.
O trabalho foi interrompido após o ministro Alexandre de Moraes suspender o acesso da parlamentar aos seus perfis. Ele também disse ter invadido o site do Conselho Nacional de Justiça e o sistema de tribunais de todo país a pedido da deputada, que também havia solicitado que ele violasse o sistema das urnas eletrônicas. Delgatti está preso desde 2 de agosto pela invasão ao sistema do CNJ.
Em nota, a defesa de Zambelli refutou as acusações e desacreditou o relato apresentado por Delgatti à CPMI, com o argumento de que o hacker usa e abusa de fantasias em suas palavras". "Suas versões mudam com os dias, suas distorções e invenções são recheadas de mentiras, bastando notar que a cada versão, ele modifica os fatos, o que é só mais um sintoma de que a sua palavra é totalmente despida de idoneidade e credibilidade", diz trecho do documento.
Na rede social X (antigo Twitter), Fabio Wajngarten, advogado do ex-presidente, negou a existência de grampo "por parte do entorno primário" de Bolsonaro.
O depoente ficou conhecido como "hacker da vaza jato" por ter interceptado mensagens de integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato e do então juiz Sergio Moro, hoje senador. À Polícia Federal, Delgatti confirmou que o material coletado no acesso à conta de autoridades no Telegram foi repassado ao The Intercept. As mensagens indicavam, de acordo com o Supremo Tribunal Federal (STF), conluio entre membros do Ministério Público e o ex-juiz Sergio Moro no processo criminal contra o atual presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva.
Uma das autoridades hackeadas foi o próprio senador Sergio Moro (União-PR). Na CPMI, Moro e Delgatti protagonizaram um embate. O senador apresentou um levantamento de ações judicias contra o hacker, com 46 casos. Delgatti disse que respondeu quatro processos e foi absolvido em todos. Moro, porém, leu trecho de acórdão condenatório ao depoente. Nesse momento, Delgatti disse que foi perseguido em sua cidade, Araraquara, por isso os processos:
"Relembrando que fui vítima de perseguição, inclusive comparada à perseguição que Vossa Excelência fez com o presidente Lula e lideranças do PT. Relembrando que li conversas do senhor, conversas privadas, e posso dizer que o senhor é um criminoso contumaz", disparou.
Moro, então, rebateu: "Gostaria de lembrar aqui que não se pode chamar um senador de criminoso, cometendo um crime de calúnia". "Retiro o que eu disse e peço escusas", emendou Delgatti. O senador seguiu: "O bandido aqui, desculpe senhor Walter, mas é o senhor. O senhor foi condenado. Quer dizer que o senhor é inocente como o presidente Lula?" O bate-boca foi, então, interrompido pelo senador Cid Gomes (PDT-CE) que preside a sessão.