Eleições municipais

O que diz Carlos Viana, senador que é pré-candidato a prefeito de Belo Horizonte

Um dos postulantes da direita à Prefeitura de BH, Viana tenta se viabilizar sem o apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro

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O senador Carlos Viana, pré-candidato a prefeito de Belo Horizonte / Crédito: Jefferson Rudy/Agência Senado

Conhecido em Belo Horizonte por ter apresentado programas jornalísticos populares na TV, o senador Carlos Viana (Podemos-MG) tem agora o desafio de ter pouco tempo de TV garantido pelo seu partido. Esta é mais uma entrevista da série com os pré-candidatos a prefeito de Belo Horizonte, que o JOTA publica ao longo desta semana.

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Pior: é um candidato evangélico, de direita, concorrendo contra um nome apoiado por Jair Bolsonaro (PL). Mesmo assim, lidera algumas pesquisas e enxerga um caminho para chegar ao segundo turno, apoiado em sua grande taxa de reconhecimento, em credenciais conservadoras e planos para incentivar construções, melhorar o transporte e acelerar os índices de educação.  

Mesmo sem apoio do ex-presidente, que na cidade estará ao lado do deputado estadual Bruno Engler (PL), Viana defende o legado do governo anterior na cidade. 

Em 2022, o senador disputou o governo de Minas Gerais esperando o apoio de Bolsonaro, que não veio. Ele se filiou ao PL, mas nem o partido no estado nem o ex-presidente fizeram força pela sua candidatura, que acabou não decolando. Bolsonaro preferiu não melindrar Romeu Zema, de quem acabou recebendo apoio no segundo turno.

Leia a entrevista com o senador Carlos Viana, pré-candidato a prefeito de Belo Horizonte nas eleições 2024

O senhor vai ser mesmo candidato? Já sabe o partido?

Sim, vou ser candidato pelo Podemos, meu partido atual.

E vocês estão negociando alianças, alguma coligação?

Estamos. Com partidos pequenos e partidos grandes. 

Quais?

Estamos em negociação com o Republicanos, União Brasil, PRTB, PMN, DC. 

Qual é sua a principal bandeira? Como o senhor pretende convencer os belo-horizontinos de que o senhor é o melhor candidato?

A minha principal bandeira é a mobilidade. Nós precisamos resolver a questão do transporte público com a maior urgência possível. Uma vez que as pessoas demoram muito tempo dentro dos ônibus, as tarifas estão altas e com viés de se tornarem maiores ainda, porque o sistema não funciona. E isso gera também no trânsito da capital um problema muito grave, que Belo Horizonte está entre as capitais brasileiras com o maior número de congestionamentos e tempo de deslocamento. Porque não foram feitas obras, muito menos se pensou o sistema de transporte público. Então, a minha principal bandeira é uma solução urgente para o transporte público da capital. Mais rapidez, tarifas mais acessíveis.

A prefeitura diz que tem melhorado, que o subsídio de R$ 500 milhões pode não ter segurado a tarifa, mas garantiu 660 novos ônibus em um ano, 80% com ar-condicionado. Que mudança especificamente o senhor defende? 

Olha, meio bilhão de reais. Um ano antes das eleições, no mínimo cheira muito mal. Não estou dizendo que houve qualquer corrupção, mas, a meu ver, foi uma decisão errada e que mostrou claramente o quanto as empresas de ônibus mandam no executivo municipal há muitos anos. As empresas, inclusive concessionárias, foram, não só da capital, mas também da região metropolitana, as grandes responsáveis para que o projeto do metrô de Belo Horizonte, não avançasse. Durante o meu mandato, eu consegui, no governo anterior, R$ 2,8 bilhões que foram alocados para a privatização do metrô de Belo Horizonte, que hoje já está em mãos de uma empresa que está executando os primeiros passos para a linha 2, ligando o Barreiro ao Calafate. São dois bairros importantes da capital. Minha preocupação em conseguir os R$ 2,8 bilhões foi exatamente porque o metrô é fundamental para a reorganização do sistema, inclusive a redução do número de ônibus no centro de Belo Horizonte. São três sistemas de transporte na capital: os da capital, da metropolitana, os que vêm das cidades do entorno até o centro, e o metrô. Os três sistemas não conversam, não se integram. Então, os três passam por dificuldades tarifárias de passageiros, porque há um interesse sempre voltado para o lucro, e quem paga é a população, com ônibus ruins, demorados. A compra de ônibus com subsídio da prefeitura deveria ser entendida como uma vergonha pelo prefeito, porque ele está dando dinheiro dos pagadores de impostos, dinheiro que faz falta na saúde e na educação, para empresas privadas que a vida inteira ganharam, nunca perderam.

E para mudar isso, seria um novo contrato, uma nova licitação, um novo modelo? O que o senhor defende? 

O que planejo é uma integração dos sistemas. A integração é fundamental para que a gente consiga manter as tarifas em preços menores, ter mais rapidez para o transporte do passageiro e garantir um deslocamento melhor no tráfego da capital. 

Com as mesmas empresas? 

Nós vamos olhar os contratos. Vamos ver os contratos quando eles vencem, e até lá, que é preciso respeitar, o que já está assinado. Mas a primeira troca, naturalmente, já será dentro de um novo processo. 

O senhor falou sobre saúde e educação, que são duas áreas de atuação muito importantes de qualquer prefeitura. O senhor pode falar, em resumo, o que o senhor imagina que é preciso melhorar, que o senhor propõe para saúde e educação? 

A saúde em Belo Horizonte tem um sistema de atendimento público que atende medianamente a cidade, mas atende. Nós avançamos muito nos últimos anos em unidades de pronto atendimento e unidades menores de postos de saúde nos bairros. Então, a cobertura na capital precisa de pequenos ajustes. O problema é a capacidade de atendimento. Falta remédio, falta médico, as pessoas esperam tempo demais. E a prefeitura não tem o que eu entendo como principal, que é uma política preventiva. Veja a dengue. A dengue é uma doença que veio para ficar. Não tem jeito. A prefeitura tem por obrigação, todos os anos, fazer campanhas educativas, promover mutirões de limpeza, e isso não foi feito no ano passado. Qual é o resultado? A dengue explodiu em números na capital, de pessoas contaminadas e mortas. Quando se acumulam nas UPAs sem atendimento, a prefeitura aluga um espaço com emergência, com urgência, com contratos que acabam depois muito mais caros para a cidade, e anuncia um atendimento melhor. A gente precisa trabalhar com prevenção. Essa é a minha visão sobre saúde. Uma prefeitura que previna, que junto com a população, entenda o que a gente precisa para que os números não fiquem tão graves como nós tivemos esse ano no caso da dengue. No caso da educação, os índices da educação em Belo Horizonte estão um pouco acima da média das principais resultados. Mas ainda está muito ruim. Nós podemos dizer que os alunos de Belo Horizonte estão na média 5 em relação aos exames principais de português e matemática. Nós precisamos fazer com que esses alunos tenham pelo menos a média 6. Não é fácil. Pelo menos. Nós temos que subir pelo menos… 

E como chegar lá?

Primeiramente com a formação dos professores. Com a capacitação dos professores municipais. A prefeitura precisa investir na formação e na seleção, no contrato de professores que realmente tenham a capacidade, a capacidade de ensinar. E que quando no serviço público sejam incentivados, com salários melhores, nós precisamos pensar nisso. E agora com o Fundeb aumentando a cada ano, há possibilidade. Outro ponto importante, o número de crianças que chegam à idade escolar em Belo Horizonte está caindo a cada ano. Primeiro fruto da baixa taxa de fertilidade da mulher brasileira. Isso é uma média nacional de 1,6 filho. O número de crianças está diminuindo. E o recurso para o ensino básico está aumentando. É uma grande chance fazermos uma virada nas creches, nas escolas, em período integral, e que essas crianças possam sair quando formadas lá no quinto ano, pelo menos sabendo ler e escrever corretamente e com toda a possibilidade em cálculos. 

A taxa de natalidade é um fenômeno nacional, mas Belo Horizonte caiu mais até em população do que a média das grandes cidades. Outros candidatos e especialistas dizem que o alto custo dos imóveis expulsa a população mais pobre para outras cidades, o que aumenta também o custo de transporte. Como transformar BH em uma cidade em que um trabalhador possa viver, morar, ter uma casa? 

Olha, o que aconteceu é que a prefeitura nos últimos anos diminuiu o potencial construtivo, o índice permitido de construção em cada terreno, e passou a cobrar das empresas o excedente. Então, por exemplo, se antes nós tínhamos 2,8 vezes o tamanho do terreno, hoje nós temos menos de 2. E a diferença tem que ser paga. Isso tornou as moradias caras. Outro ponto importante, e nós não temos feito: o nosso plano diretor não permite que tenhamos prédios mais altos em várias partes da cidade. Nós precisamos repensar o plano diretor, porque os prédios são bons onde você já tem um adensamento, onde você já tem avenidas, onde você já tem comércio, onde você já tem estúdio, onde você já tem estúdio. Onde você já tem escola, serviço de saúde que atenda corretamente, os prédios atraem serviços, permitem que as pessoas morem mais perto do trabalho. Então nós precisamos repensar a política para construção de prédios em Belo Horizonte. Da mesma maneira que nós precisamos pensar também na preservação de áreas históricas e construções, não se vai falar em destruí-las para poder edificar, nada disso. A cidade tem que andar em paralelo. Mas nós não podemos entender também que todo lugar da cidade precisa ser preservado, porque não é verdade. Tem muitos locais que a gente pode avaliar as construções que não são importantes do patrimônio e a permissão de se construir prédios maiores onde há inclusive prédios pequenos. A gente precisa ouvir o setor da construção para poder tornar a cidade mais competitiva. O censo mostrou que Belo Horizonte perdeu 60 mil habitantes, fora os que já foram morar na região metropolitana. Nova Lima, região norte aqui da área metropolitana de Belo Horizonte. Isso tudo tem afastado as pessoas. E outra coisa, o trânsito ruim. Morar em Belo Horizonte mais próximo da área central se tornou um pesadelo. As pessoas não conseguem se deslocar. O centro de Belo Horizonte está abandonado. Hoje a gente passa a ter prédios fechados, as ruas escuras, sujas, moradores de rua para todo lado. Isso nós temos que começar a repensar. Como nós vamos fazer para atrair novamente as pessoas para mais perto do centro, para perto do trabalho? Precisa conversar com o setor da construção civil e mudar regras que hoje estão travadas lá dentro da prefeitura. 

São ideias que privilegiam a verticalização e a construção comercial para a classe média que vai conseguir fazer um financiamento. E para moradia mais popular. O que o senhor tem pensado?

Belo Horizonte teve um programa mais bem sucedidos em urbanização de vilas e favelas e aglomerados, o Vila Viva, aqui na região sul-leste. Vários prédios foram construídos nos locais. As famílias não foram deslocadas para longe, como era no passado. É um programa que parou e que Belo Horizonte não retomou, porque infelizmente não tem um projeto de futuro para toda a cidade. O que a gente observa nos aglomerados hoje é que estão aumentando as casas em áreas de risco, as invasões, as construções em áreas complicadas da cidade. São construções em áreas não formais da cidade, que voltaram a aumentar. Isso é risco. Belo Horizonte tem muitos anos que não tem mortes em vilas e aglomerados por conta de chuvas e deslizamentos. A qualquer momento a gente pode voltar a ver isso. Por quê? Não há controle. E também não há incentivo à moradia popular. Belo Horizonte não tem mais área rural. Nós temos dificuldade com áreas para construção. Então nós temos que partir para urbanizar os terrenos em vilas e favelas e permitir que mais famílias possam morar nessas regiões que estão mais perto do centro da cidade. 

O senhor falou que há áreas que não necessariamente precisariam ser preservadas, poderiam ter mais construções, atender mais pessoas. O senhor tem alguma mapeada já?

Há várias regiões de Belo Horizonte em que temos casarões antigos que precisamos preservar. Mas há casas dos anos 50, anos 40, que não fazem parte do patrimônio e cujos moradores ficam muitas vezes impedidos de construir. Região da Lagoinha, por exemplo. Não é uma região que está totalmente preservada, mas é uma região que tem uma série de prédios novos que têm 30, 40 anos, que poderiam muito bem ser substituídos por um prédio comercial, uma residência comercial, um prédio muito melhor do que o que existe hoje para recuperar aquelas áreas.

BH tem candidato do ex-presidente Bolsonaro, tem candidato do presidente Lula, talvez tenha do governador Zema. Em 2022, concorrendo ao governo de Minas, o senhor esperava o apoio do então presidente Bolsonaro e isso não aconteceu. Como agora pretende fazer uma campanha sem esses apoios. E pior: contra candidatos apoiados por eles? 

Eu sou um senador da República. E nesses quatro anos em que estou na política, porque eu não sou candidato, eu sou um senador da República,  aprendi como lidar com a política por dentro dela. Antes, eu via a política por fora. Hoje, não. Hoje eu sei como trabalhar por dentro dela. Tenho experiência para poder saber o que é lidar com uma Câmara de Vereadores, o que é a necessidade de você manter um bom contato com o governo federal, porque sem ele você não consegue os recursos que você precisa para a cidade. Essa foi uma das grandes falhas inclusive do governador de Minas: não ter diálogo com o governo federal. O resultado é que o estado não conseguiu sair do atoleiro que são as dívidas públicas. E eu aqui em Belo Horizonte sou candidato pelas minhas idéias. Quero deixar claro para as pessoas que polarização não vai resolver os nossos problemas. Na campanha de governador, nós ficamos só entre direita e esquerda. Nós não discutimos transporte público. Resultado: está aí a população reclamando de um trânsito absurdo. Por quê? Porque nós não fizemos compromisso nenhum. Nós não falamos sobre escolas públicas, sobre melhoria na qualidade do ensino. Nós não falamos sobre melhoria de estado, nós não falamos sobre nada. Nós ficamos num debate raso entre direita e esquerda, ideológico, partidário, que não leva o Brasil a nada. Está levando o Brasil a ficar parado no tempo da economia e perdendo espaço no mundo moderno. Essa vai ser a minha grande mensagem para a população de Belo Horizonte: vamos deixar a ideologia pra princípios de eleição, mas vamos pensar em quem vai resolver os problemas. Porque não é Bolsonaro nem é Lula quem vai resolver os problemas do lixo, vai resolver o problema de moradia. Sou eu, se for prefeito. E eu entendo que quem é candidato tem que fazer compromisso. Não é promessa, é compromisso. E eu estou fazendo um compromisso de nós melhorarmos o trânsito da cidade, de pensarmos a cidade. Estou fazendo um compromisso de atrair investimentos para Belo Horizonte. Um compromisso de tornar a cidade um grande centro cultural para poder encher os hotéis como o Carnaval encheu, que é uma festa popular que ganhou espaços e pode ser replicada, inclusive. Nós podemos criar outros festivais para poder atrair multidões para Belo Horizonte. Esse é o meu pensamento. Eu sou um candidato, como eu disse, das minhas ideias. Eu não sou um candidato que vai repetir o que Bolsonaro fala, porque tenho as minhas divergências com ele. Muito menos com o Lula, que eu entendo que tem um discurso muito populista e que, no fundo, acaba deixando o país sempre num buraco econômico difícil de sair.

O prefeito Fuad nos disse que Lula representou uma mudança em questões de convênios, PAC, programas, obras. Nas palavras dele, Belo Horizonte era um buraco no mapa de Bolsonaro. O senhor considera, primeiro, que houve essa mudança qualitativa de relação do governo federal com a prefeitura? E como pretende fazer essas parcerias? 

Primeiro, eu fui vice-líder do governo Bolsonaro, três anos. Eu nunca vi, e desafio que a prefeitura apresente um grande projeto para Belo Horizonte que tenha sido levado ao governo federal. O prefeito da capital, após a saída do Kalil, foi pouquíssimas vezes a Brasília. Com a base ali, com alguns deputados, por exemplo, senadores, nunca esteve comigo no Senado. Nunca esteve com os deputados para levar propostas da cidade. Então, ele não tem que falar sobre questões de relacionamento com o governo anterior. Porque, se houvesse propostas, eu tenho certeza que elas teriam sido avaliadas. Então, acho muito fácil e oportunista levantar essa questão. Com o governo Lula, o que está acontecendo? Lula veio aqui e propôs R$ 121 bilhões de PAC para o estado. Eu fui o primeiro a dizer, olha: eu sou membro do orçamento, não tem esse dinheiro, isso aí é uma promessa vazia. E não deu outra. O governo está cortando agora R$ 15 bilhões do orçamento, porque não tem dinheiro, para controlar a inflação. Então, falar é muito fácil. A questão é fazer. Eu fiz. Eu pus R$ 2,8 bilhões no metrô de Belo Horizonte, que estava há 35 anos esperando uma resposta. Esse dinheiro ficou parado muito tempo, até a privatização. E hoje ele é a grande saída para a cidade. Então, foi feito no governo passado, no Bolsonaro. Acredito que o prefeito atual esteja com a memória falhando em relação a entender que ele não levou proposta nenhuma a Brasília. E se levou, essas propostas não chegaram ao conhecimento daqueles que representam o estado. Que é o meu caso como senador.

Existe a possibilidade de uma pré-candidatura do deputado estadual Mauro Tramonte, que tem um perfil parecido com o do senhor, passou por alguns dos mesmos lugares. O senhor acha que vocês dois vão disputar ou estarão juntos? 

A meu ver, o Mauro não é candidato. Porque ele tem um contrato com a televisão e naturalmente isso geraria uma dificuldade. Agora, se ele vier, vai ser muito bom porque conhece bem a cidade. Seria muito bom, mas não acredito. Nós temos conversado bastante. Ele politicamente está ligado aos Republicanos e naturalmente que ele vai seguir a orientação do partido. O Republicanos abraçando a minha candidatura, como nós estamos caminhando para isso, o Mauro será um bom apoiador, muito popular e que vai ajudar a somar muito pela cidade. 

O senhor é o terceiro candidato que me diz ter certeza de que leva os Republicanos. 

Risos.

O senhor falou da questão ideológica. Como o senhor pretende se posicionar nessa disputa que, por mais que diga que não afeta a eleição municipal, vai ser um tema que vai ser trazido pelos próprios candidatos. O senhor é de direita ou de esquerda?

Eu sou de direita. Sou da economia liberal. Sou do capitalismo. Sou da avaliação de mérito. Eu acredito que as pessoas têm que ter oportunidades iguais, mas são elas quem constroem seu próprio sucesso. Essa é a base da direita. A questão é que, no Brasil, direita se tornou sinônimo de bolsonarismo. Eu não sou bolsonarista em várias posições. Eu tenho algumas ideias, algumas propostas, que coincidem e que eu trabalhei no governo passado, junto com o ex-presidente. Mas há outras que não. Eu tenho a minha definição. A principal delas: eu sei dialogar. Eu não preciso brigar com ninguém que é da esquerda para poder provar o que eu acredito. Eu tenho as minhas definições, as minhas convicções, e o lado de lá tem os dele. E hoje, por exemplo, estou no Podemos. É um partido em que nós sentamos com o governo e convergimos para aquilo que é possível. Ontem, por exemplo, em uma reunião com o ministro Padilha, reunindo lá a bancada evangélica, da qual eu sou presidente no Senado, da Frente Evangélica, nós chegamos a consensos sobre a questão da imunidade das igrejas, sobre a questão da Receita Federal e a chamada prebenda dos ministros religiosos. Houve consenso, houve diálogo. Eu sei fazer isso. Agora, a extrema-direita, que representa o presidente aqui, não dialoga. A cidade precisa de quem sabe conversar. Eu vou exercitar isso. Eu sei conversar, tenho paciência. E a esquerda, em algumas ideias, pode nos ajudar também a pontos em que eles têm razão e que se for bom para a cidade, nós vamos abraçar. 

Por que um professor tem que pagar imposto sobre o próprio salário e o pastor não?

As igrejas são imunes constitucionalmente.

Mas o pastor é também?

O pastor é também. Os padres, por exemplo, têm uma remuneração muito pequena. Por quê? Eles não são casados, não têm filhos, não pagam aluguel. As igrejas são construídas pela própria instituição. Os pastores não. Os pastores trabalham de dia para sustentar as famílias e de noite, muitas vezes, até constroem paredes para poder ter a própria igreja. A imunidade é constitucional. Isso é da Constituição de 88. O que a Receita fez foi simplesmente começar a cobrar em cima das remunerações. Em todas as situações. Então, vou te citar um exemplo. A igreja tem, por exemplo, uma editora onde ela edita as bíblias e vende essas bíblias para o trabalho missionário. A Receita entendia que tinha que cobrar imposto sobre isso. E está escrito na Constituição, que é a imunidade. É esse assunto que nós estamos colocando à mesa com o governo. E estamos definindo, inclusive, qual é o teto para chamarmos de prebenda. Um pastor que tira 150 mil reais da igreja, isso não é uma prebenda. Naturalmente, isso é fora do contexto. São pouquíssimos. A maioria ganha dois, três salários mínimos. Moram em periferia. Pagam aluguel, muitas vezes. Não têm uma convenção nacional que o ajude a sustentar. Vivem dos dízimos. É uma realidade bem diferente daquilo que muitas vezes. 

E qual seria o teto que o senhor está defendendo?

Não, eu não defendo. O governo propôs 70% dos salários do ministro do Supremo. 

E o senhor acha que faz sentido? Ou acha que faz sentido que um pastor que ganhe R$ 100 mil não pague imposto?

Eu não concordo que um pastor que ganha R$ 100 mil não pague imposto. Não concordo. Eu acho que nós temos que ter um teto. Tem que ter um teto. Nós temos que ter uma definição clara. R$ 100 mil reais é uma margem de ganho, hoje, de um presidente de uma grande empresa. Isso não faz parte do trabalho religioso. Mas nós precisamos ter uma definição. Porque a gente não pode ficar à mercê do entendimento da Receita. E toda vez que a Receita divulga alguma coisa, tem que se dizer que as igrejas evangélicas querem privilégios. Nós queremos estar na Constituição porque os templos das igrejas evangélicas são construídos pela população. Até a Constituição de 88, a Igreja Católica ganhava terreno e praças para construir igrejas. Era de graça. Nós sempre tivemos que pagar. Hoje, a construção de uma igreja numa periferia, quem paga é o pastor e a comunidade dele. Agora, existe um livro até que eu vou recomendar, que se chama “Povo de Deus”, que é do Juliano Spyer, um pesquisador da USP. Foi o trabalho mais honesto que eu já vi sobre o crescimento dos evangélicos no Brasil. Ele fala sobre isso. Sobre como as igrejas surgem no seio das comunidades, convivem bem com terreiros, a Igreja Católica, não tem nada de violência. E que os pastores sobrevivem da renda das pessoas que estão ali.

Foi construída uma identificação muito grande do bolsonarismo com as igrejas. E o bolsonarismo vai ter um candidato em BH. Como o senhor pretende furar essa identificação?

Essa proximidade com o bolsonarismo surgiu da necessidade de que os princípios dos evangélicos no país fossem respeitados. A esquerda sempre teve, vamos dizer assim, a definição sobre si mesma de impor pautas. A esquerda se entende como a única inteligente. 

Mas o senhor não considera que agora é a direita que está tentando impor pautas, inclusive culturais? 

Não! Pelo contrário. Nós estamos simplesmente defendendo os nossos posicionamentos. Questão do aborto, por exemplo. Nós não concordamos. A vida começa quando ela está ali no seio da mãe. A Constituição diz que a vida tem que ser protegida. Então nós somos contra. E constantemente nós somos surpreendidos por portarias, decretos de ministérios tentando legalizar o aborto no Brasil. Nós somos surpreendidos com o relatório do ministro Barroso, por exemplo, abrindo a possibilidade de aborto para todos os tipos do Brasil. O Brasil já tem uma lei de aborto suficiente em que a mulher, quando é vítima de violência ou risco de vida, pode optar. Está ótimo. Essa definição é muito importante. Está ótimo. Essa definição foi feita em consenso com a sociedade, com os evangélicos e com os laicos também, que não estão conosco. Foi feito um equilíbrio. Agora, por que que quer se impor uma pauta? Por exemplo, durante o governo Dilma, foram feitas várias reuniões da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados tentando criminalizar pastores, padres, sacerdotes, que não realizassem casamentos para pessoas do mesmo sexo. Olha, no cartório, as pessoas dos casamentos homoafetivos são tão iguais como todos os outros, porque lá no cartório nós estamos falando de Constituição e lei, mas nas igrejas quem define são os religiosos, não é o Estado quem tem que impor. E isso chegou a ser questionado.

O senhor não é contra o casamento civil de pessoas do mesmo sexo?

Não, de jeito nenhum. Isso é um direito que eles têm, como cidadãos. 

Como senador, o senhor tem acompanhado a discussão sobre a renegociação da dívida de Minas com a União. Como vê a situação? Como a dívida chegou até aqui e como sair dela?

Primeiro: essa dívida já poderia ter sido resolvida durante o governo Bolsonaro, se o Partido Novo tivesse aceitado fazer política, conversar com a Assembleia e buscar consenso. Política é para o diálogo. O Partido Novo não dialogou com a Assembleia, não avançou, e o problema da dívida se tornou crônico. Outra questão: em política não há espaço vazio. Alguém ocupa esse espaço. Como o governo de Minas não negociou com a Assembleia, não conseguiu chegar a um acordo com o governo federal que fosse satisfatório, entregou para a Assembleia Legislativa o problema, e o governador viajou, ficou quase um mês fora do estado, com o projeto na Assembleia. O presidente da Assembleia, que é um jovem astuto, quando viu que geraria uma discussão muito grande com o funcionalismo público e, se não aprovasse, geraria um problema com o governo, o que que ele fez? Buscou o presidente do Congresso Nacional, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. Levou o problema. Enquanto o governador estava lá na Ásia, o problema então foi levado ao presidente da República para se conversar politicamente como deveria ter sido feito desde o começo. Por isso é que eu vejo que o governo de Minas perdeu o protagonismo, o governador perdeu o protagonismo, caiu aos pés do Pacheco para ele marcar um gol e vai conseguir resolver o problema. A entrega das estatais mineiras Copasa, Cemig, seria um prejuízo para Minas Gerais. Porque se essas empresas fossem vendidas no mercado, elas valeriam muito mais. Agora é aquela história, o que aparecer o governo de Minas tem que se agarrar, porque não tem saída. 

O senhor apoia então a federalização?

Apoio. Se é para resolver o problema da dívida e o estado poder voltar a ter investimentos, então que siga esse caminho. Mas não era o melhor. Outras soluções já poderiam ter sido feitas, como eu disse, desde o governo anterior.

Estou sentindo o senhor muito crítico ao governador Zema e muito próximo ao senador Pacheco. O senhor vai apoiar o Pacheco em 2026? 

Não, não é isso. Eu faço uma avaliação sincera, porque eu tomo decisões em cima de dados. Eu gostaria muito que o Zema me apoiasse para prefeito. Seria muito bem-vindo. Mas isso não vai tirar de mim o direito de falar o que eu penso sobre o governo dele, que tem avanços também, tem coisas boas. Aqui eu entendo que ele teve uma situação muito difícil. Faltou política. É a crítica que eu faço. Agora, se ele quisesse me apoiar em Belo Horizonte, estaríamos no mesmo time. Para mim seria muito bom. Quanto ao Pacheco, meu relacionamento com ele é um relacionamento de colegas de Senado. O Pacheco é uma pessoa muito preparada, mas nós não estamos em campos iguais. O campo político do Pacheco é totalmente diferente do meu. 

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