Invenção da humanidade

O mundo da IA deve seguir os princípios da convivência humana, diz Celso Mori

Advogado abordou nova revolução tecnológica e seus limites éticos em palestra na OAB-SP, durante evento com JOTA e Microsoft

Celso Mori, advogado sócio do Pinheiro Neto | Foto: Mateus Sales/ OAB-SP

Um ditado comumente atribuído à tradição dos nativos americanos, especialmente ao povo Cherokee, diz que dentro de cada um de nós mora um lobo bom e um lobo mau e que vai prevalecer na luta constante entre eles aquele que nós alimentarmos melhor. Conhecida como “A história dos dois lobos”, a lenda foi contada por Celso Mori, sócio do Pinheiro Neto Advogados, para promover uma reflexão sobre os riscos e as potencialidades do uso da inteligência artificial. 

Mori foi keynote speaker no evento Inteligência Artificial Generativa para Advogados: explorando oportunidades, nesta quarta-feira (12/6). O evento foi realizado pelo JOTA, em parceria com a OAB-SP e apoio da Microsoft, na sede da entidade, no Centro de São Paulo. A abertura foi da presidente da OAB-SP, Patricia Vanzolini. 

Na perspectiva do palestrante, o Direito tem papel fundamental na definição das aplicações futuras da inteligência artificial porque o caminho a ser percorrido depende fundamentalmente da regulação a ser feita no universo jurídico. “É preciso que o Direito atue para que tenhamos filtros para tirar o melhor da IA e evitar os problemas que ela possa vir a causar. O Direito é a ciência que permite, pela regulação e pelas leis, a convivência humana”, explica ele.

Segundo Mori, os princípios essenciais a serem observados são o da equidade, o da privacidade, o da confiabilidade e o da transparência. “O mundo da inteligência artificial não é diferente do de outras atividades humanas, em que precisamos confiar desconfiando, para chamar à responsabilidade aqueles que transgridem”, disse. 

Assim, a confiabilidade do sistema deveria prever que não apenas ele vai dar informações e percepções da realidade, mas também nos “permitirá nos defender quando nos sentirmos atacados dentro dele”. 

Resultados inesperados

Segundo Mori, a humanidade presencia inovações em uma aceleração tão grande que dificulta a assimilação dos aprendizados recentes. Essa sucessão de transformações mostra que o surgimento de grandes novidades tecnológicas têm alguns pontos em comum – entre eles, o de que toda transformação relevante tem um objetivo, consciente ou não, mas resultados nem sempre esperados. Como exemplo, estão as criações de artefatos com pólvora, a prensa móvel de Gutenberg, as máquinas a vapor e a Internet.

“A invenção da Internet é interessante porque cada um de nós é capaz de enaltecê-la pelos seus benefícios, mas também conhecemos os crimes e deturpações sociais que acontecem por meio dela”, disse ele. “Toda transformação ocorre por meio de uma escolha e nós somos moralmente responsáveis pelas escolhas que fazemos na Internet e no desenvolvimento da inteligência artificial. Temos que trabalhar para que tudo se mantenha nos limites da dignidade humana”.

IA e a atuação do advogado

Durante sua fala, Mori se apresentou como “um advogado com muita experiência na advocacia e não muita no mundo digital”. “Cada coisa tem seu tempo, e agora é o tempo da inteligência artificial. As coisas não se transformam, necessariamente, em seu contrário, mas nas suas alternativas de transformação. Somos nós que fazemos as escolhas do que queremos transformar e temos responsabilidade sobre elas”, disse.

O papel do advogado, ao longo de todas essas transformações, foi reinventado e terá de ser tantas outras, mas a profissão nunca deixou e não deixará de ser relevante para a sociedade e para a Justiça, afirmou.

Mori disse reconhecer que a entrada no mundo da inteligência artificial é inevitável, mesmo que não se saiba muito bem como e nem onde chegaremos com ela. Mas, para uma pista do que aguardar, ele recomendou a leitura do livro “Armas e Ferramentas: o futuro e o perigo da era digital”, de Brad Smith e Carol Ann Browne, com prefácio de Bill Gates. Entusiasmado com a franqueza e a sinceridade dos autores, a conclusão a que Mori chega é simples, mas aparentemente inconclusiva: “este é o mundo da inteligência artificial, o mundo das descobertas que se faz no caminho que se inventa ao caminhar”.