Diego Werneck Arguelhes

O ministro Lewandowski encontrou <a href="http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2015/07/dilma-tem-encontro-fora-da-agenda-com-lewandowski-e-cardozo.html">a presidenta Dilma fora do País</a> e da agenda;  o ministro Gilmar Mendes <a href="http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/07/1655405-cunha-discute-impeachment-com-ministro-do-supremo.shtml">encontrou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha</a> (PMDB-RJ), em sua residência. Esses encontros são sintomas de um descompasso mais geral. O Supremo assumiu posição central na política brasileira. Mas seus ministros ainda não sedimentaram critérios consensuais básicos para conciliar a atuação judicial e a participação na política.
O poder do Supremo na nossa democracia tem contrapartida institucional clara: quem decide conflitos tem que se manter independente em relação a eles. Ministros precisam guardar distância pública e visível das disputas que precisarão decidir. Para isso, o comportamento junto aos outros poderes é decisivo. Quem se apresenta como articulador político ou consultor jurídico de partes em conflito arrisca sua imparcialidade como juiz na decisão futura.
O comportamento individual público – ou, o que é mais grave, tornado público - nos encontros da semana passada pode afetar a imagem da instituição. E a imagem de independência da justiça no Brasil não é das melhores. Segundo os relatórios do Índice de Confiança na Justiça produzido pela FGV Direito SP, <a href="https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/11221/Relat%C3%B3rio%20ICJBrasil%20-%20Ano%204.pdf?sequence=5&amp;isAllowed=y">de 2012</a> <a href="https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/12024/Relat%C3%B3rio%20ICJBrasil%20-%20ano%205.pdf?sequence=1&amp;isAllowed=y">até 2014</a> <a href="https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/13599/Relat%C3%B3rio%20ICJBrasil_2%C2%BA-e-3%C2%BA-Trim_2014.pdf?sequence=3&amp;isAllowed=y">cerca de 60% dos entrevistados</a> consideraram o judiciário “pouco” ou “nada independente”.
Boa parte dos juízes brasileiros, aliás, quer mais distância entre o Supremo e os outros poderes de Estado. Em 2005, <a href="http://editora.fgv.br/magistrados-uma-imagem-em-movimento">em pesquisa da AMB organizada por Maria Teresa Sadek</a>, avaliaram negativamente (em especial os juízes de primeira instancia) a imparcialidade e independência do Supremo em relação aos poderes eleitos. Juízes lá embaixo <a href="http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1808-24322013000100003&amp;script=sci_arttext">criticam a politização dos ministros de cima.</a>
A cobertura da imprensa sugere que encontros entre ministros do Supremo e representantes dos outros poderes não foram fenômenos raros nos últimos meses. Antes da indicação de Edson Fachin para o Supremo, <a href="http://epoca.globo.com/tempo/expresso/noticia/2015/05/lewandowski-pediu-ajuda-renan-para-aprovacao-de-fachin.html">noticiou-se um encontro de Lewandowski com Renan Calheiros</a>, presidente do Senado; o Ministro buscava apoio para a indicação de Fachin; na época, Lewandowski era relator de inquérito contra Calheiros.
Em março deste ano, na véspera da mudança do ministro Dias Toffoli para a 2a Turma do Supremo, que julgará a Lava Jato, <a href="http://politica.estadao.com.br/noticias/geral%2ctoffoli-vai-a-dilma-apos-mudanca-no-stf%2c1648746">a imprensa noticiou um encontro entre Gilmar Mendes, defensor público da mudança de Toffoli, e Eduardo Cunha</a>, um dos investigados na operação. Mendes afirmou <a href="http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/03/1601516-alvo-da-operacao-lava-jato-cunha-se-reune-com-gilmar-mendes-do-stf.shtml">não ter tratado da Lava Jato</a> na reunião.
Os dois encontros da semana passada não foram públicos. A falta de transparência é, em si, problema grave. Encontros de juízes e políticos são fatos jornalísticos. São dados a serem levados em conta na hora de interpretar os comportamento desses juízes dentro dos autos, em seus votos.
Mas, ainda que públicos, quais são afinal os limites desses encontros? Lewandowski afirma ter encontrado Dilma para discutir salários do judiciário, como presidente da corte. Mesmo assumindo que seja esse o teor da conversa, isso não a torna inofensiva. O presidente do Supremo escolhe a pauta e lidera o procedimento decisório interno do tribunal, que está prestes a decidir questões de alto impacto para o governo.
Nem todos os encontros sobre temas não decisórios são espúrios. Alguns poucos talvez sejam necessários. Mas, quando ocorrem à sombra de poder decisório iminente, dos ministros, sobre o destino dos políticos, são em princípio suspeitos. Arranham a imparcialidade da decisão futura.
Alguns ministros parecem discordar. Enquanto puderem dizer que não trataram de decisões, Mendes e Lewandowski não veem problema nas reuniões, secretas ou públicas. A versão oficial teria a propriedade mágica de normalizar qualquer encontro, inclusive em contextos perigosos para a imagem de imparcialidade da instituição. Difícil imaginar que todos os ministros do Supremo pensem da mesma forma.
Com o crescente poder do Supremo, aumentará também a demanda por reuniões dos Ministros com agentes políticos. Precisamos discutir esses limites e cobrá-los dos Ministros. O vale-tudo que vivemos hoje é tóxico para a legitimidade que o comportamento comedido de gerações de ministros ajudou a construir. Quem guarda a Constituição deve, antes de tudo, guardar a sua própria legitimidade para fazê-la cumprir.

Dilma e Lewandowski

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

O que as reuniões de Dilma e Lewandowski e de Gilmar Mendes e Eduardo Cunha têm em comum?

Ligações perigosas

O que as reuniões de Dilma e Lewandowski e de Gilmar Mendes e Eduardo Cunha têm em comum?