Felipe Recondo

O julgamento da desaposentação pelo Supremo Tribunal Federal nesta quarta-feira pode impactar a proposta de Reforma da Previdência em estudo no governo Temer. O texto em discussão no governo trata da desaposentação e teria de ser repensado caso o Supremo admita a possibilidade de um aposentado voltar a trabalhar e depois pedir o recálculo do seu benefício.
A advogada-Geral da União, Grace Mendonça, afirma esperar que os ministros levem esse fato em consideração. “Há um impacto, caso a União venha a perder, de R$ 7,7 bilhões ao ano. Num contexto de restrição orçamentária e de responsabilidade fiscal como pressuposto para sobrevivência do Estado, é lógico que isso tem peso”, afirmou a ministra em entrevista ao JOTA.
Grace Mendonça disse ainda que o governo continua a conversar com a Caixa Econômica e agora com o Banco do Brasil uma saída acordada para a disputa em torno dos planos econômicos e a correta correção das cadernetas de poupança nos anos 80.
Primeira mulher a integrar a equipe ministerial do presidente Michel Temer e também a comandar a AGU, Grace afirmou ainda que pretende fortalecer o papel da pasta nos acordos de leniência
Leia abaixo, a entrevista concedida pela ministra.
JOTA - O Supremo retoma na quarta-feira o julgamento sobre desaposentação. Como julgar isso em meio à discussão de Reforma da Previdência? Houve pedidos ao Supremo para a retirada de pauta. A União vai pedir também para adiar o julgamento?
GRACE - A AGU não pediu para retirar esse tema de pauta. E nem vamos pedir. Nós estamos monitorando as petições. Esperamos que o tribunal tenha essa sensibilidade de perceber que este tema será julgado quando se está discutindo a Reforma da Previdência, sendo que a desaposentação é um dos pontos que estarão na proposta. Há um impacto, caso a União venha a perder, de R$ 7,7 bilhões ao ano. Num contexto de restrição orçamentária e de responsabilidade fiscal como pressuposto para sobrevivência do Estado, é lógico que isso tem peso.
JOTA - Uma decisão que eventualmente diga que a desaposentação é possível teria impacto sobre a proposta do governo?
GRACE -  Gera reflexo com toda a certeza. Nós vamos ao Supremo acompanhar o julgamento, conversar com os ministros, entregar memoriais. Temos dois votos favoráveis à tese do INSS. E há o voto do ministro Barroso que, para o INSS, não é positivo. Vamos trabalhar como se o Supremo fosse concluir o julgamento. Nosso trabalho nós fizemos: levantamos os dados, atualizamos o impacto disso, as teses foram todas incluídas no processo. A gente sabe que os ministros da Corte terão a sensibilidade que o tema requer.
JOTA - Como a senhora analisa a tese, suscitada no julgamento dos Recursos Extraordinários 566.471 e 657.718, de que a União é a responsável pela distribuição de medicamentos de alto custo?
GRACE -  Com muita preocupação, porque isso vai gerar uma revisão da legislação como um todo. Hoje as responsabilidades estão muito bem desenhadas na lei. Tem as hipóteses que a União transfere o recurso e o estado adquire o medicamento. Tem a hipótese em que a União transfere e o município adquire. E tem aquelas hipóteses em que a União adquire o medicamento, que são hipóteses excepcionais. A partir do momento que vem uma interpretação dessa, qualquer cidadão vai entrar contra a União. A gente vê com bastante preocupação essa linha de entendimento, porque a União já vem sendo inserida no polo passivo de diversas demandas. Agora a gente sabe que isso acaba potencializando a atuação da União. Então a legislação como um todo terá de passar por uma reflexão. Em que medida alguma modificação na lei pode trazer uma definição melhor dos papéis. O simples fato de a comissão da Anvisa ser responsável  pelo registro dos medicamentos não quer dizer que a União é responsável pelo fornecimento. São situações distintas.
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JOTA - Planos econômicos. A senhora disse, em entrevista ao jornal Valor Econômico, que a AGU está conversando com a Caixa sobre possível acordo no julgamento de planos econômicos. Como está essa conversa? E os demais bancos?
GRACE - Tivemos um diálogo bastante positivo com a Caixa Econômica, avançamos também um pouco com o Banco do Brasil. Lógico que não é um tema simples e não é um consenso que se obtenha da noite para o dia. Há preocupações de todos. É nesse ambiente de conversa que sabemos melhor qual é a preocupação de cada um. Nossa prioridade é encontrar um ponto em comum em relação aos bancos oficiais.
JOTA - Até porque nos bancos privados o impacto é menor.
GRACE - A gente sabe que o impacto maior é na Caixa Econômica Federal
JOTA - E os poupadores também indicam que querem um acordo.
GRACE - Exatamente.  Então tem caminhado bem o diálogo. Nesta semana tivemos mais duas reuniões.
JOTA - O STF está sabendo dessas tratativas?
GRACE - Não sabe formalmente, mas já conversamos na linha de se estar trabalhando na construção de uma saída. Eu gostaria de apresentar ao Supremo quando já tivéssemos uma sinalização mais positiva. Se tivermos a sinalização de que é viável numa perspectiva razoável...Talvez hoje a maior preocupação seja em face de quem se fará um acordo. Quem vai representar todo esse pessoal (os poupadores). Hoje a maior dificuldade tem sido essa. Quem representa? Precisamos antes fechar uma posição dos bancos oficiais para depois partir para o enfrentamento dessas questões. A ideia do acordo, acho, é bastante positiva. E a gente ajuda o Judiciário a se desafogar. Dependendo de quais forem os termos, como construiremos esse acordo, podemos dar conforto para o Supremo de uma homologação.
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JOTA - AGU e o Ministério da Transparência estão formulando uma minuta para regular o trâmite dos acordos de leniência. Como está esse trabalho?
GRACE - Nós já estamos na fase final dessa minuta de portaria. Eu tenho de conversar com o ministro da Transparência para a visão final. A ideia é trazer a AGU para o momento antecedente a todas essas tratativas. A AGU vem entrando sempre na reta final. Aliás, a AGU vem entrando quando já finalizou tudo. Aí ela entra para dar uma chancela e dizer que está tudo ok. Mas a AGU não tem a oportunidade de alguma forma opinar sobre valores, opinar sobre quem seriam os beneficiários, os termos em si, a extensão do acordo. A gente não participa de nada disso. O acordo já chega com formato pronto e a AGU entra para verificar algumas coisas e dar sequência. Isso fica complicado. A gente tem nossa expertise, know how nas ações de improbidade, de ressarcimento ao erário, que é  um trabalho que fazemos há anos aqui. A ideia nossa, e que foi muito bem recebida pelo Ministério da Transparência, é que a AGU participe desde o início. Nós sabemos que há muitas dificuldades. Tenho conversado com o Tribunal de Contas da União para ver de que forma o TCU pode nos ajudar para que esses acordos sejam efetivamente implementados. E a ideia também é conversar com o Ministério Público. Mas precisamos primeiro nos acertar aqui.
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JOTA - como vai lidar com acordos que já estão sendo firmados no Ministério Público? Como a AGU vai se comportar?
GRACE - A ideia é jamais voltar (atrás), porque ninguém quer atrasar o ritmo dos trabalhos. A ideia é, a partir de agora, criar uma sistemática nova para que a AGU se insira nisso desde o início. Os acordos que já estão numa fase mais adiantada, a AGU pode analisar e, se tiver algum ponto que ainda possa ser acomodado à luz da nossa interpretação e sem prejudicar o fluxo das negociações, a ideia é apresentar nosso parecer. Caso contrário, não temos perspectiva de voltar, de recomeçar as negociações. Na linha da colaboração e da contribuição, se a AGU puder contribuir positivamente, ela fará, sem prejudicar as etapas deste acordo no Ministério da Transparência ou no Ministério Público.
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JOTA - Qual é a perspectiva das ações de improbidade contra os políticos alvos da Operação Lava Jato? Alguma previsão?
GRACE - A equipe tem trabalho justamente nessa perspectiva. O volume é muito grande de informações. A equipe está analisando todas as informações para mover essas ações. Eles estão trabalhando livremente, como sempre trabalharam, desenvolvendo a linha deles. É um trabalho que foi sempre muito reservado. Quando eles trazem as informações para cá, já está tudo analisado com profundidade. O que conversei com o pessoal daqui foi compartilhar a forma como eu vejo e sempre atuei no Supremo no ajuizamento das ações: sempre por uma avaliação responsável. Para chegar ao ponto de AGU ingressar com a ação, é porque tem toda a convicção técnica de que a ação é cabível. A partir do momento em que se insere qualquer pessoa no polo passivo de uma demanda dessa ordem, é preciso se considerar que há reflexos.
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JOTA - Há figuras investigadas na Lava Jato que ocupam altos cargos da República, do Senado, do governo. Alguma interferência política pode haver para não se entrar com uma ação contra este ou aquele?
GRACE - Nenhuma. Nenhuma interferência política.
JOTA - E as ações serão propostas mesmo que ainda estejam tramitando no Supremo inquéritos ou ações penais contra esses agentes?
GRACE - Qual a documentação que estamos avaliando hoje: aqueles casos em que o Supremo, do ponto de vista criminal, já mandou arquivar. Então, como há linhas distintas de responsabilidade, estamos analisando as responsabilidades cíveis e administrativas dos casos que o Supremo já arquivou. Eu entendo bem a pergunta porque na época do mensalão a AGU aguardou o desfecho do processo criminal para entrar com as ações. Como a nossa força tarefa já vem acompanhando há muito esses trabalhos da Operação Lava Jato, eles mesmos que nos dizem quando podemos buscar informações de tais e tais processos. A ideia da AGU é buscar a responsabilização civil e administrativa nesses casos em que o Supremo já determinou o arquivamento.
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JOTA - Guerra fiscal. A ministra Cármen Lúcia, depois da reunião com governadores de estado, pautou diversos processos que tratam de tributos e guerra fiscal. É pelo Supremo que esta questão será resolvida?
GRACE - Não seria o ideal que fosse pelo Supremo. Mas o que temos observado, não apenas sobre guerra fiscal, mas das demandas dos estados contra a união: quantas e quantas liminares deferidas em favor dos estados - e cujo mérito não é levado a julgamento – enfraquecem a Lei de Responsabilidade Fiscal? Tudo isso gera impacto. Muitas vezes vemos o Supremo se debruça sobre questões relativas à guerra fiscal tributária quando o ideal seria que os estados e a União sentassem à mesa nos ambientes apropriados para resolver. Hoje, parece muito mais fácil levar o assunto ao Supremo. Não temos de levar ao Supremo. Todas as instituições têm sua missão muito bem desenhada pela Constituição. O Congresso não precisa levar para o Supremo suas questões. O Executivo pode resolver suas questões. Tudo isso para que muitos desses assuntos deixem de ser inseridos no âmbito de atuação do Supremo.

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JOTA

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